Revogação acontece pouco mais de três meses após a medida ser adotada; Saúde afirma que mudança é administrativa e que cuidados devem ser mantidos
Diretora do Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa), Andrea von Zuben apresenta o comparativo de casos confirmados, óbitos e letalidade em Campinas, São Paulo e Brasil até o dia 11 de junho; queda expressiva de infecções em junho contribuiu com a decisão do Executivo (Carlos Bassan)
Após pouco mais de três meses, a Prefeitura de Campinas anunciou ontem, dia 14, em coletiva de imprensa, o fim do estado de emergência para dengue. A medida foi adotada em 7 de março com o objetivo de agilizar a máquina pública para permitir ações extras da Administração Municipal, como mais rapidez na compra de insumos e de materiais para nebulização, além do pagamento de horas extras para reforçar a assistência da população no enfrentamento à epidemia, que em 2024 tornou-se a maior da história da cidade.
O decreto para revogar o estado de emergência deve ser publicado no Diário Oficial na próxima segunda-feira, dia 17. Entre janeiro e a última quinta-feira, dia 13, a Secretaria Municipal de Saúde registrou 107.557 casos e 37 mortes.
Segundo a Prefeitura, o fim do estado de emergência está relacionado à capacidade de resposta do Município para enfrentamento da dengue. A situação de emergência permitia a adoção de todas as medidas administrativas e assistenciais necessárias à contenção do aumento de casos de dengue. Isso garantiu, por três meses, maior agilidade na compra soro e outros materiais, além do pagamento de horas extras para reforçar a assistência, neste caso por meio da abertura de mais centros de saúde ou ampliação de horário aos sábados.
Outra mudança diz respeito aos mutirões, até então realizados durante a vigência do estado de emergência em um modelo mais robusto, com voluntários e de forma intersetorial. Agora, segundo a Prefeitura, eles serão mais espaçados, porém não serão interrompidos.
EXPLICAÇÃO
A avaliação, em apresentação feita aos jornalistas presentes no Palácio dos Jequitibás, sede da Administração Municipal, é que, desde 5 de maio, há uma diminuição gradativa dos casos confirmados por causa da redução das temperaturas. Em abril, pico da epidemia em Campinas, foram confirmados 33.528 casos. Houve uma ligeira queda, até o momento, nas notificações positivas de maio, com 26.725. Em junho, até o momento, foram 1.278 ocorrências positivas de dengue.
A taxa de letalidade na cidade, inclusive, é menor do que os índices registrados em território estadual e nacional: 0,03 (Campinas) contra 0,07 (São Paulo) e 0,09 (Brasil).
Segundo a diretora do Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa), Andrea von Zuben, a análise técnica, com pareceres do Departamento de Saúde e da Rede Mário Gatti, indicam que a cidade consegue realizar as ações de combate e prevenção à dengue, além de assistência em saúde aos pacientes, sem precisar de uma medida excepcional.
“A gente decreta a emergência para dar agilidade na máquina pública e para aumentar o financiamento, conseguir comprar insumos, melhorar a ação de controle do vetor (mosquito Aedes aegypti) e a assistência aos pacientes. Em maio já tivemos menos casos, e em junho uma queda expressiva, não justificando mais essas ações emergenciais”, comentou.
De acordo com o secretário de Saúde de Campinas, Lair Zambon, a Pasta garantiu assistência para todos os pacientes com sintomas de dengue e, ao mesmo tempo, manteve condições para receber casos que envolvem as demais doenças, incluindo demandas represadas desde o período mais crítico da pandemia de covid-19. “É importante ressaltar que projetamos um cenário complicado nos próximos anos em relação às arboviroses, ou seja, não apenas a dengue, mas outras doenças, como a chikungunya, devido ao nosso clima tropical natural e também às mudanças (climáticas), que trouxeram mais altas temperaturas. São fatores que ajudam a explicar o que estamos passando. Mas, apesar do fim do decreto, o combate à dengue continua.”
Além disso, ainda de acordo com as autoridades públicas na coletiva, a introdução de três sorotipos que circulam na cidade ajuda a explicar o recorde de casos de dengue neste ano em Campinas.
ENTENDIMENTO
O médico epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina da São Leopoldo Mandic, André Ribas Freitas, afirmou que a revogação do decreto de emergência depende mais de questões administrativas do que epidemiológicas. Segundo ele, o que precisa ser considerado é a capacidade de resolver os problemas com os recursos disponíveis na rotina do dia a dia, mas a preocupação deve continuar. “Do ponto de vista epidemiológico, ainda preocupa. Ainda temos um número grande de casos de dengue, apesar da redução em relação aos meses anteriores. Ao mesmo tempo, temos de nos preocupar também com a chikungunya. Ela é transmitida pelo mesmo vetor e na mesma época, em média, do que a dengue. Ou seja, não podemos bobear”, avaliou.
O entendimento da população, apesar da revogação do decreto, é que a doença ainda está presente de forma intensa na vida dos campineiros. É o que diz a analista de sucesso do cliente, Jussara Coimbra Fernandes dos Santos. Ela esteve no Centro de Saúde do Jardim Eulina na tarde de ontem, com suspeita de dengue. Com sintomas desde o último dia 7, Jussara afirmou que a situação da doença segue sendo grave. “Desde o início dos sintomas eu não consegui trabalhar, então eu perdi uma semana inteira de trabalho e me impactou bastante. Agora que eu estou conseguindo começar a melhorar, mas na minha família outras pessoas também tiveram. Eu acho que ainda é uma coisa muito crítica para a gente”, disse.
Quase sem voz, a vendedora Ariane Cristina de Souza Belarmino foi ao CS do Jardim Eulina após uma febre de 38.5°. Com sintomas de dengue desde a última terça, dia 11, ela descreveu as dores no corpo como “muito intensas” e disse que muitas pessoas seguem pegando a doença. “Na minha rua eu vi três senhoras de idade que pegaram. Então percebo que a dengue ainda está por aí.”
NOVO ÓBITO
A epidemia da doença fez mais uma vítima fatal na Região Metropolitana de Campinas (RMC). Com o novo óbito confirmado em Nova Odessa, o total de mortos na região chegou ontem a 89, de acordo com o Painel de Dengue do Estado de São Paulo.
De acordo com a assessoria de imprensa da Prefeitura de Nova Odessa, o Instituto Adolfo Lutz confirmou na última quinta-feira o terceiro óbito causado por dengue em 2024. Trata-se de uma paciente mulher, de 66 anos, moradora do Jardim Alvorada, que apresentou sintomas no dia 17 de maio, procurou atendimento médico em um hospital de convênio em Americana e faleceu no dia 26 do mesmo mês, em Campinas. As duas vítimas anteriores do vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti foram uma mulher de 54 anos, que faleceu em 10 de maio no Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp; e uma mulher de 42 anos, moradora do Altos do Klavin, que faleceu em um hospital de Piracicaba em 15 de abril.
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