Médicos realizam procedimento chamado de embolização de aneurisma cerebral, que visa fortalecer a parede de vaso sanguíneo enfraquecido (Divulgação)
Campinas registrou um total de 418 óbitos devido a Acidente Vascular Cerebral (AVC) nas instalações da rede municipal de saúde ao longo do ano de 2022, de acordo com um levantamento conduzido pela Secretaria Municipal de Saúde a pedido do Correio Popular. Esse número representa o mais alto índice de mortalidade por esta causa nos últimos quatro anos, refletindo em uma taxa de 36,73 óbitos a cada 100 mil habitantes. Os dados correspondem a 4,58% do número total de óbitos registrados pelo sistema de saúde durante esse período, totalizando 9.132 casos.
Especialistas destacam a importância da atenção à saúde preventiva como a principal abordagem para enfrentar essa doença, a qual se estima que afetará 1 em cada 4 brasileiros nos anos vindouros. Eles também enfatizam a crítica importância do intervalo de tempo entre a identificação dos sintomas e a busca por atendimento médico.
Os dados da Secretaria de Saúde revelam que em 2021 foram registrados 349 óbitos por AVC dentre um total de 10.658 mortes, indicando um aumento de 16,51% quando comparados aos 418 óbitos do ano subsequente. Naquele ano, a taxa de incidência era de aproximadamente 30 mortes a cada 100 mil habitantes.
No ano de 2020, os AVCs foram responsáveis por 356 mortes em um conjunto de 8.592 registros de óbitos, correspondendo a 4,14% do total. A taxa de incidência foi calculada em cerca de 31 mortes por 100 mil habitantes.
Finalmente, no ano de 2019, último período considerado pelo levantamento, foram contabilizados 324 óbitos em um universo de 7.481 casos, perfazendo 4,33% do total. A taxa de incidência nesse ano foi aproximadamente de 28 casos por 100 mil habitantes.
O AVC, juntamente com o infarto do miocárdio, permanece como a principal causa de mortalidade no Brasil e uma das principais em todo o mundo.
Segundo o neurorradiologista e especialista em intervenções médicas, Thiago Abud, do Centro Médico de Campinas, diversos fatores podem explicar o aumento da incidência de AVCs entre os residentes da região. De acordo com ele, a deterioração da qualidade de vida, eventos climáticos extremos e avanços tecnológicos na detecção da doença desempenham um papel significativo nesse aumento.
"É crucial levar em consideração a multiplicidade de fatores de risco, como o sedentarismo, o tabagismo, a obesidade e a hipertensão arterial. Durante a pandemia, todos esses fatores se agravaram notavelmente, resultando em uma deterioração abrangente da qualidade de vida. Além disso, as mudanças climáticas abruptas, cada vez mais frequentes, também contribuem para o aumento da incidência, especialmente as transições abruptas entre temperaturas quentes e frias. Por último, mas não menos importante, temos atualmente uma maior disponibilidade de tecnologias de diagnóstico em comparação com anos anteriores. Os equipamentos de diagnóstico estão constantemente se modernizando", esclarece o Dr. Abud.
Existem dois tipos principais de AVC: isquêmico e hemorrágico. O AVC isquêmico ocorre quando uma artéria está obstruída, impedindo o fornecimento de oxigênio às células cerebrais, que acabam por falecer. Essa obstrução pode ser causada por trombose ou embolia.
Por outro lado, o AVC hemorrágico ocorre quando um vaso sanguíneo cerebral se rompe, resultando em hemorragia. Esse tipo de evento pode ocorrer no tecido cerebral ou na área entre o cérebro e a meninge. De acordo com dados do Ministério da Saúde, o AVC hemorrágico é responsável por 15% de todos os casos de AVC, entretanto, ele é mais letal e pode acarretar em sequelas mais graves.
Segundo o doutor Li Li Min, médico e neurocientista da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é de suma importância aumentar a conscientização da população sobre a identificação dos sintomas de um AVC, visto que uma assistência urgente desempenha um papel fundamental na redução da taxa de mortalidade.
"Existe um ditado que diz 'tempo é dinheiro', porém, quando se trata de um AVC, o tempo equivale a cérebro. A cada minuto que passa, milhões de neurônios se perdem, e quanto mais rápido for o atendimento, maiores serão as chances de sobrevivência. As células nervosas são extraordinariamente sensíveis à falta de energia - ou seja, oxigênio e glicose - em comparação com outras células do corpo, as quais possuem uma maior resistência. Logo, quanto mais tempo essas células ficarem privadas desses elementos, maior será o impacto negativo", explica o doutor Li Li Min.
O doutor Li Li Min introduz um método para identificar os primeiros sinais de um AVC, que ele chama de "SAMU", mesma sigla utilizada para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência. De acordo com o cientista, se qualquer um dos passos não puder ser realizado com precisão, isso indica a necessidade iminente de buscar atendimento hospitalar.
"Solicite à pessoa que sorria e observe se ela consegue fazêlo. Verifique se ela apresenta assimetria facial, o que é conhecido como 'boca torta'. Se isso ocorrer, constitui um primeiro sinal. Outra técnica é abraçar a pessoa e observar se um dos braços está mais fraco do que o outro; isso é outro indicador. O terceiro passo é pedir que a possível vítima cante uma música que ela goste. Em caso de AVC, ela pode ficar confusa e não conseguir se comunicar corretamente. Por último, se qualquer um desses sinais estiver presente, contate imediatamente os serviços de emergência. Esses quatro passos formam a sigla SAMU: Sorriso, Abraço, Música e Urgência", aconselha o doutor Li Li Min.
Conforme destacado pelo médico, um intervalo de até 4 horas e 30 minutos é de extrema importância para a completa recuperação do paciente em casos de AVC isquêmico, sendo recomendado buscar atendimento dentro da primeira hora, o que os profissionais médicos se referem como a "hora de ouro".
Patricia Vequisse, de 39 anos e profissional de limpeza, recorda com minúcia o momento em que começou a experimentar os primeiros sintomas de um AVC. Ela relata: "Eu estava me sentindo bem, fui para a cama naturalmente por volta das 20h e, às 3h da manhã, comecei a sentir um frio intenso, algo difícil de descrever. Além disso, senti muita dor nos ossos. Meu filho chamou o SAMU, que me levou para o hospital, e a partir desse ponto, eu já não conseguia prestar atenção em nada. A pressão na minha cabeça era avassaladora, e eu perdi a consciência. Recordo-me de que o lado direito do meu corpo também não respondia; foi uma experiência terrível."
Após ser submetida a exames no Hospital Mario Gatti, Patricia foi diagnosticada com AVC, recebendo tratamento imediato. Embora tenha modificado alguns hábitos, o fato de ser fumante a coloca em risco de passar por outra situação semelhante.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Doenças Cerebrovasculares, 1 em cada 4 brasileiros enfrentará um AVC em algum momento da vida. Conforme apontam os especialistas, a prevenção é, de fato, a melhor abordagem. O médico Li enfatiza: "Adotar uma alimentação saudável, manter uma prática regular de exercícios, evitar o tabagismo e monitorar a pressão arterial são dicas clichês, mas que realmente têm o poder de salvar vidas."