Bolsonaro já se declarou fã e aliado incondicional do presidente norte-americano Donald Trump (Alan Santos/PR)
O presidente Jair Bolsonaro criticou ontem a "ingerência de outras potências" no atual processo eleitoral dos Estados Unidos e já lançou dúvidas sobre possíveis interferências na eleição de 2022 no Brasil, na qual ele pretende tentar a reeleição. "É inegável que as eleições norte-americanas despertam interesses globais, em especial, por influir na geopolítica e na projeção de poder mundiais", publicou Bolsonaro no Twitter. "Até por isso, no campo das informações, há sempre forte suspeita da ingerência de outras potências no resultado final das urnas. No Brasil, em especial pelo potencial agropecuário, poderemos sofrer uma decisiva interferência externa, na busca, desde já, de uma política interna simpática a essas potências, visando às eleições de 2022." O presidente afirmou que vê a América Latina caminhando para a esquerda. "Não se trata apenas do Brasil. Devemos nos inteirar, cada vez mais, do porquê, e por ação de quem, a América do Sul está caminhando para a esquerda. Nosso bem maior, a liberdade, continua sendo ameaçado. Nessa batalha, fica evidente que a segurança alimentar, para alguns países, torna-se tão importante e aí se inclui, como prioridade, o domínio da Amazônia." No fim de setembro, Bolsonaro rebateu declaração do candidato democrata Joe Biden sobre auxílio financeiro à Amazônia e possíveis consequências econômicas, se a preservação da região não melhorasse. Na ocasião, ele avaliou a fala de Biden como "lamentável", além de "gratuita e desastrosa". "Bolsonaro tem uma vaga noção do que ocorre no mundo e confunde os interesses de mercado com posição ideológica", diz o cientista político José Álvaro Moisés, da USP. "Ele não aceita a diversidade política que pode levar a esquerda ao poder. Seu conceito de liberdade é restritivo, se refere apenas às correntes que ele defende.” De olho na eleição Bolsonaro passou o dia de ontem de olho na eleição dos Estados Unidos. Além da torcida por Donald Trump, de quem já se declarou fã e aliado incondicional, o presidente brasileiro acompanhou o desempenho do líder americano no confronto com o democrata Joe Biden como um laboratório para 2022, quando tentará a recondução ao Palácio do Planalto. Com a declaração do vencedor nos Estados Unidos, a Presidência já está preparada para que Bolsonaro faça um telefonema ao vitorioso. Ontem, na saída do Palácio da Alvorada, Bolsonaro perguntou a apoiadores "vai dar Trump ou vai dar Biden?". Após ouvir de um apoiador que "tem que dar Trump", o presidente disse: "Não vou nem responder. Tem gente que acha que o Brasil está livre de problemas. Cheio de estrategista político por aí. Estou confiante com a reeleição de Trump, porque será boa para as relações comerciais e diplomáticas com o Brasil", afirmou. Bolsonaro já se manifestou em várias oportunidades favoravelmente à reeleição de Donald Trump. No último dia 20, em evento no Palácio do Itamaraty, declarou: "espero, se essa for a vontade de Deus, comparecer à posse do presidente brevemente reeleito nos Estados Unidos. Não preciso esconder isso. É do coração". Vitória de Biden pode gerar cobranças O vice-presidente Hamilton Mourão avaliou que a possível vitória do democrata Joe Biden pode trazer mudanças nas cobranças ao Brasil em relação ao meio ambiente. Segundo ele, a equipe de Biden pode ter uma atuação mais "incisiva" que a atual de Donald Trump. "Mas vamos lembrar que os Estados Unidos é um dos países que mais emitem gás carbônico no mundo. Primeiro, eles (EUA) têm que resolver os problemas deles para depois vir para os nossos." Na avaliação dele, a depender do resultado do pleito norte-americano, podem haver "mudanças pontuais" nas relações com o Brasil, mas "no conjunto da obra", os países manterão "as mesmas ligações". "O relacionamento do Brasil com os Estados Unidos é um relacionamento de Estado para Estado, independente do governo que estiver lá. Óbvio que cada governo tem suas prioridades e tem suas características", afirmou. Mourão comentou a defesa de Bolsonaro pela reeleição de Trump. "Isso aí é opinião pessoal dele. Se bem que quando o presidente fala, ele fala por todos do governo". Mourão reiterou que a posição brasileira em caso de judicialização das eleições americanas será de neutralidade. Donald Trump já sinalizou que o pleito pode ser alvo de disputa judicial em caso de sua derrota. "Não temos nada a ver com as questões internas americanas. Isso é princípio constitucional. A gente não admite ingerências em nossos assuntos internos e não fazemos nos assuntos internos dos outros." Hoje, Mourão embarca em viagem à Amazônia com um grupo de embaixadores na tentativa de melhorar a imagem do Brasil sobre preservação ambiental. Integram a comitiva os ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles; da Agricultura, Tereza Cristina; e do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno. Trump propôs ações drásticas na Venezuela O presidente Donald Trump defendeu "ações mais drásticas" contra a Venezuela em conjunto com o Brasil, Panamá e Colômbia. A revelação foi feita pelo ex-presidente Michel Temer em seu livro A Escolha, no qual ele é entrevistado pelo professor de filosofia Denis Lerrer Rosenfield. Segundo Temer, o presidente americano não deixou claro se isso se tratava "de uma intervenção ou não" no sentido militar contra o país vizinho. A reunião entre Temer e Trump aconteceu em 18 de setembro de 2017, às vésperas da reunião anual das Nações Unidas, em um hotel, em Nova York. O jantar oferecido pelo americano teve ainda como convidados os presidentes da Colômbia, Juan Manuel Santos, e do Panamá, Juan Carlos Varela. A pauta do encontro era a Venezuela. "Mais de um presidente falou em exercer pressões e jogou lenha na fogueira. O Temer pôs água na fervura", afirmou o ex-ministro das Relações Exteriores brasileiro, Aloysio Nunes Ferreira. No relato de Temer, a solução drástica do americano recebeu a rejeição dos outros presidentes.