Aumenta a procura por explantes e a valorização de um corpo sem procedimentos
Gabriela Moraes, que é diabética desde criança, fez dieta regrada e exercícios frequentes para perder 23 quilos de forma natural depois da gravidez (Ricardo Lima)
A relação da cantora e musicoterapeuta campineira Maíra Rodrigues com o próprio corpo na adolescência era bastante complicada. Ela acreditava que tinha algum problema de desenvolvimento uma vez que seus seios eram pequenos. “Eu não ficava nua na frente das minhas amigas, nem mesmo do namorado. Então decidi colocar silicone aos 21 anos”, diz. A intervenção estética realmente devolveu a autoestima a Maíra, que passou 11 anos com o implante mamário. Porém, em mais de uma década com as próteses, sua mentalidade mudou muito. Hoje, com 34 anos, não se vê mais fazendo uma cirurgia para mudar o seu corpo. “Eu sou uma pessoa muito natural, como coisas saudáveis e faço exercícios. Não faria mais esse procedimento”, conta. E então veio o explante, a retirada do implante mamário, em junho de 2021.
O Brasil é o segundo país que mais faz a cirurgia de colocação de prótese mamária (está atrás apenas dos Estados Unidos). Mas, de acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética, ainda que a colocação das próteses mamárias mantenha uma alta procura dentro dos procedimentos estéticos, o número vem caindo. Entre 2018 e 2019 (último dado disponível), houve 3,6% menos procedimentos, enquanto o mesmo período apontou alta de 10,7% nas cirurgias de retirada do silicone.
O dado é confirmado por Leandro Faustino, cirurgião plástico membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. “Em conversas com colegas, percebo que a procura por explantes tem aumentado muito, especialmente nos últimos dois anos”, afirma. Ainda é pouco em comparação a procura por implantes, mas a mudança já é sentida.
Foco no explante
O que levou Maíra a pensar no explante foram vários sintomas que ela começou a relacionar à presença das próteses em seu corpo. “Eu tinha enxaquecas, infecções urinárias frequentes, retenção de líquido, crise de sinusite crônica e uma respiração curta”, explica a cantora. Em grupos nas redes sociais, ela trocou informações com outras mulheres com implantes que tinham passado ou estavam passando por situações semelhantes.
O cirurgião Leandro confirma que mesmo que em uma minoria dos casos, é possível, sim, haver complicações com as próteses de silicone dentro do organismo da pessoa. “Representa menos de 5% dos casos. A cada ano existem implantes com tecnologias cada vez melhores, mas nenhum cirurgião pode negar que existem, sim, alguns riscos”, alerta.
O explante não só pôs fim aos sintomas de Maíra, como psicologicamente, depois de algumas semanas, melhorou sua autoestima. “No começo é estranho, foram altos e baixos. Além de não estar mais com o corpo com o qual eu convivi durante 11 anos, eu senti muita culpa por ter mexido duas vezes nele. Me causava dor”. A terapia a ajudou muito a lidar com essas mudanças. “Mas depois eu comecei ter mais disposição, uma energia melhor, e eu me sinto realmente mais bonita do que quando eu tinha silicone. É sempre? Não. Às vezes eu coloco uma roupa e sinto falta de ter seios maiores. Mas tudo bem. Ninguém nunca vai alcançar o corpo perfeito que é ditado pela sociedade”, relata a cantora.
A valorização do corpo natural feminino
Para a psicoterapeuta Thais Barros Rocha, especialista em Psicologia Clínica Comportamental, esse corpo citado por Maíra, que é “jovem e magro” é definido por uma cultura dominante que não leva em consideração os esforços, as questões emocionais envolvidas e até a saúde no processo de atingir o padrão. “Começa com o corpo magro, depois vem a flacidez, então as rugas e os cabelos brancos. Nunca vai parar”, esclarece.
Portanto é muito importante que exista uma valorização do corpo natural feminino, que sofre muito mais cobranças do que o masculino. E para tanto, esclarece Thaís, é preciso que haja mais representatividade de corpos de mulheres diferentes na mídia, nas propagandas, nos filmes e nas séries. “Acho que o caminho para aceitarmos essas mudanças é justamente vermos o corpo de mulher madura na televisão, por exemplo, e não só aquela que veste tamanho 36”, diz a psicoterapeuta. Mas isso não significa que a pessoa não deve fazer nenhum tipo de intervenção estética.
Beleza com equilíbrio
Gabriela Moraes, jornalista de 39 anos, não estava satisfeita com o próprio corpo, especialmente depois do nascimento da filha. “Eu tinha ficado um bom tempo dedicada a ela e, quando fez dois anos, decidi olhar para mim”. Mas, desde o início, sua escolha foi apostar em caminhos naturais para atingir os objetivos que almejava. A partir de uma dieta regrada e exercícios frequentes, ela mudou completamente a sua rotina, perdeu 23 quilos de gordura e ganhou 10 quilos de massa magra. “Partes do meu corpo que antes eu não gostava, hoje acho bonito. Também sou diabética tipo 1 desde os seis anos e esse foi outro fator que me motivou a cuidar da saúde”, conta ela, que garante estar se sentindo muito bem consigo mesma.
Segundo a psicoterapeuta Thaís, acima de tudo é preciso ter a consciência de que a mulher pode modificar o seu corpo de uma maneira amena e que já esteja em sintonia com ela mesma. “As mulheres de fato costumam melhorar sua autoestima após procedimentos estéticos, mesmo com a consciência de que não precisam estar dentro de um padrão”, completa. Equilíbrio entre corpo, mente e autoestima no lugar certo é a chave.
Leandro defende que a felicidade das pacientes não pode depender de atingir o corpo desejado. “Eu acredito e faço no meu consultório o que eu chamo de cirurgia consciente. Antes do procedimento, eu quero entender se a relação da paciente com aquele padrão estético almejado é saudável. Se não for, cirurgia nenhuma vai trazer essa felicidade. Ainda que ela faça a cirurgia, vai continuar frustrada”, alerta.