LANÇAMENTO

Livro sobre cinema privilegia inovação na telona

Em História do Cinema, crítico Mark Cousins evita falar sobre o mercado e enfoca o meio cinematográfico

João Nunes
igpaulista@rac.com.br
15/07/2013 às 05:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 08:57

O que pensar do livro História do Cinema, de Mark Cousins (Martins Fontes, 512 págs., R$ 89,00) em um tempo em que qualquer consulta ou dúvida sobre o assunto se encontra na internet ao alcance de um clique? O autor, ex-diretor do Festival Internacional de Cinema de Hamburgo (Alemanha), introduz o assunto dizendo que não quer falar da indústria e seus dividendos, mas do meio, e cita uma frase da atriz Lauren Bacall para referendar seu ponto de vista: “A indústria é uma m..., mas o meio é grandioso”.

E, de cara, anuncia que não irá se concentrar em uma história do cinema “distorcida pelos caprichos do mercado”, mas falar sobre os filmes mais inovadores e de vários países. A inovação, segundo ele, impulsiona a arte. E chega ao paroxismo de dizer que muitas das produções favoritas dos leitores não estarão representadas no livro — nem as dele próprio. Só esta abertura já serve para instigar a leitura.

Ao se posicionar desta forma, ele cita muitos exemplos, mas chama a atenção para O Resgate do Soldado Ryan (Steven Spielberg, 1998), perfeito produto bem-sucedido com mais de 80 milhões de ingressos vendidos em todo o mundo. Porém, o que interessa a Cousins é a espetacular longa sequência de abertura feita de modo inovador. Exemplo: furadeiras foram acopladas à câmera para dar efeito de trepidação, entre outras. Os melhores cineastas se perguntam todos os dias como podem transformar o corriqueiro em algo diferente, diz o autor.

Ele também defende a tese de — mesmo sem se esquecer de famosas e importantes obras — que pretende dar visibilidade a filmes que foram influentes historicamente e não fizeram sucesso. “Quantos grandes filmes não parecem ter tido impacto por terem sido feitos no continente africano, ou foram mal distribuídos, ou fracassos de bilheteria, ou dirigidos por mulheres, ou mal compreendidos, ou proibidos?”, escreve. E cita Touki Bouki - A Viagem da Hiena (1973), do africano Diop Mambéty, como o filme mais inovador de sua época, e que não foi adequadamente distribuído nem na África.

Cousins provoca polêmica ao não atribuir o nascimento do cinema aos irmãos franceses Lumière, em 1895, como se convencionou historicamente — a partir da exibição do célebre A Chegada de um Trem à Estação de La Ciotat. Ele não só afirma que não houve um inventor (mas muitos e em diversos países), como prova que as primeiras imagens em movimento são do curta-metragem Leeds Bridge, do francês Louis Le Prince (1888), feito na Inglaterra.

Ainda assim, não quer a pecha de revisionista — não só por conta da data do nascimento do cinema —, mas também por atribuir importância a filmes pouco conhecidos. A defesa dele: este livro não é sobre o cinema ocidental, mas mundial. Tanto que, mesmo acentuando o papel e a importância do cinema dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Itália, da França, do Japão e da Rússia, a abrangência na análise é extensa: Índia, Tunísia, Austrália, Polônia, Irã, Vietnã, Egito, Mali, Dinamarca, Etiópia, Suécia, entre muitos outros. Entre os latinos, as principiais citações são de Cuba (Memórias do Subdesenvolvimento, 1968), México (Amores Brutos, de 1999, e E Sua Mãe Também, de 2001) e Brasil.

Do Brasil, ele começa com Limite (1930), de Mario Peixoto, marco vanguardista da América Latina e chega ao Cinema Novo, com ênfase em Vidas Secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos, e seu “filme-irmão” Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha, inspirado nos faroestes de John Ford e editado com influencia do russo Serguei Eisenstein — cita também Rio 40 Graus (1955), que junto com Vidas Secas explora a visão brasileira do neo-realismo italiano.

Mais recentemente, ele inclui Central do Brasil (1999), de Walter Salles, destacando os diálogos e as atuações de “resultados esplêndidos”, e Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles. A foto deste, aliás, abre a terceira parte do livro. Sobre o filme, lembra a ironia do título e a influência de Os Bons Companheiros, de Martin Scorsese.

Estrutura

Apesar da citação explícita de Louis Le Prince, o autor respeita a história, digamos, oficial ao dividir o livro em três épocas: Mudo (1895-1928), contando, portanto, a partir dos irmãos Lumière, Sonoro (1928-1990), Digital (de 1990 até os dias de hoje). E, dentro delas, subdivide os tópicos: os primeiros filmes, a nova linguagem advinda da Segunda Guerra (como o surgimento do neo-realismo), os grandes movimentos nacionais de renovação (Nouvelle Vague na França, Cinema Novo no Brasil, etc), o aparecimento do modernismo, o cinema político, a ascensão do blockbuster e as novas tecnologias, entre outros.

O que mais chama a atenção no livro de Mark Cousins é sua capacidade crítica (ele é crítico) diante do relato. Quer dizer, ele não apenas narra fatos que, sim, são facilmente encontrados na internet, mas os interpreta. E o faz não somente sobre os períodos ou movimentos, mas sobre os filmes. Não por acaso, ele garante ter revisto grande parte dos filmes que cita. E que não viu uns 40 porque não encontrou as cópias.

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