Os brasileiros estão lendo mais deste o início da pandemia de acordo com dados do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Arte/ RAC)
Os brasileiros estão lendo mais deste o início da pandemia de acordo com dados do Sindicato Nacional dos Editores de Livros. Somente em fevereiro deste ano foram vendidos mais de 3,7 milhões de livros no País, conforme a versão mais recente da pesquisa Painel do Varejo, parceira da instituição com a Nielsen. O número representa um crescimento de 18,69% no volume de exemplares vendidos em comparação com o mesmo período do ano passado. Desde março de 2019, quando o isolamento social passou a ser uma constante na rotina do brasileiro, o setor vem comemorando aumento de vendas, tendência que navega na contramão dos fechamentos das livrarias presencias.
Ter as pessoas em suas casas, como medida de enfrentamento à covid-19, alinhado ao desejo de encontrar maneiras para “fugir” das atividades rotineiras que exigem a tela - seja do computador, da televisão ou do celular – são “ingredientes” da receita que leva ao resgate do hábito de ler no Brasil, segundo representantes do setor. Também a vontade de conhecer novos títulos/gêneros/autores por parte dos leitores ajuda – vide o fenômeno do romance Torto Arado, de baiano Itamar Vieira Franco, que, apesar de lançado em 2019, antes da pandemia, é considerado um dos maiores fenômenos da literatura “pós-covid”, estando a semanas entre os mais vendidos do Brasil.
Para os que gostam de novidades, a boa notícia é que Campinas e cidades da região também possuem lançamentos literários neste início de 2021 – e que prometem surpreender positivamente. Entre eles está O Dia Perdido, primeira obra de ficção da campineira Larissa de Oliveira Neves, pela editora Patuá. Professora do departamento de artes cênicas e pesquisadora de teatro brasileiro da Unicamp, desde 2009, a autora campineira debate teatro, a partir das atividades da Semana de Arte Moderna de 1922.
“A Semana de Arte Moderna de 1922 foi um grande acontecimento para cultura do Brasil, na ascensão do modernismo, mas apesar de ter reunido poesia, artes visuais, música e outras modalidades não teve teatro. Como pesquisadora, a ausência da arte cênica sempre me intrigou. Por que não?”, conta Larissa. A indagação é ponto de partida para sua ficção cuja narrativa se concentra na (irreal) tentativa de organização de uma peça de teatro para a Semana de 1922. “É uma história metateatral, onde eu imagino como seria levar o teatro para aquele momento. É uma peça com muita metalinguagem, com base em crônicas da época e no imaginário artístico do período, em que muitos dos personagens do livro são inspirados em nomes como os de Heitor Vila Lobos, Osvaldo de Andrade, Mário de Andrade e Alcantara Machado.”
Por ter sido contemplado com recursos do ProAC - Edital 23/2019 - o livro de Larissa será distribuído gratuitamente para 100 bibliotecas públicas de São Paulo. Além disso, a autora tem como meta levar para escolas públicas de Campinas uma leitura dramática da obra, com debate sobre o teatro brasileiro e a relevância da Semana da Arte Moderna. “Ainda estou em conversa com as escolas, a ideia é levar o livro para o maior número de pessoas possível.”
Para crianças
Outra novidade é, também em forma de ficção, O que é da Margarida?, estreia na literatura da musicista Wal Baseio, inspirado na história da fundadora de Santa Bárbara d’Oeste, Margarida da Graça Martins, pela Editora Adonir. O livro é ilustrado por Gabrielle Maria, também estreante nesse segmento editorial, e acompanha um suplemento para pais e educadores.
Destinada a crianças em processo de pré-alfabetização, com idade entre quatro e seis anos, a obra narra a trajetória de Margarida da Graça Martins que, em 1818, fundou o município barbarense. “Em 2018, tive a honra de ser convidada para ser a protagonista do musical Santa Bárbara 200 anos e interpretar Dona Margarida, o que me levou a mergulhar na história dessa grande mulher, à frente de seu tempo”, revela a escritora.
“Eu escolhi contar a história da cidade, pensando no universo infantil e de modo que fosse uma atividade que despertasse interesse pela história, de um jeito prazeroso. Importante dizer que o livro reúne diversas pessoas, não só a minha escrita, mas o trabalho de edição e da ilustradora também foram fundamentais. Eu sempre penso que desafio de estar na literatura é enorme, porque para se lançar um livro é algo complexo, muito mais do que a gente imagina”.
O livro é parte de projeto realizado com recursos da Lei Aldir Blanc, por meio da Secretaria Especial da Cultura, Ministério do Turismo, Governo Federal, Secretaria Municipal de Cultura e Turismo e Prefeitura de Santa Bárbara d’Oeste e contempla também a exposição das ilustrações de Gabrielle Maria em data a ser confirmada.
A de Anita
O poeta, dramaturgo e ficcionista Marco Catalão, de Campinas, assina duas novidades para leitores em 2021: o primeiro é o Catálogo Poético da Semana de 22, pela editora Mondrongo, e no qual apresenta 68 poemas, divididos em 26 grupos, cada um destes corresponde a uma letra do alfabeto e à um personagem da semana de 22. Exemplo: A de Anita Malfatti ou Z de Zina Aita. Catalão também lançou o romance O País das luzes flutuantes, editora Filocalia, que tem como temática a imigração japonesa, especificamente na região do Vale do Ribeira paulista. O enredo ficcional envolve personagens com fatos históricos, tradições e heranças culturais trazidas do Japão para o Brasil.
Já o livro Dizem que toda caverna é assim..., de Daniel Menin e Luciene Tognetta, também da Editora Adonis, integra apresentação no World Creativity Day, o maior festival de criatividade do mundo e será lançado amanhã com a participação do autor por meio do vídeo Das cavernas para as escolas: uma proposta interdisciplinar - que aborda o projeto e o trabalho com alunos por meio da publicação.
Mais impostos para livros?
O aumento na venda de livros, no entanto, está longe de trazer paz ao setor literário. E não só por que, recentemente, voltou a pauta dos noticiários a polêmica intenção do Governo Federal – anunciada ano passado por Paulo Guedes - de acabar com a isenção tributárias (de impostos como PIS e Cofins) dos livros.
No mês passado, a Receita Federal, por meio de uma pesquisa, voltou a defender o fim da isenção com a alegação de que apenas os ricos leem no País. A declaração, naturalmente, causa revolta no setor, porém especialistas da região ouvidos pelo Caderno C acreditam que o mais importante nesse debate é a contribuição social dos livros e seu papel fundamental na educação.
“Os livros são um meio de propagação do conhecimento. E isso deveria ser um entendimento irrestrito. Em um país tão desigual como o nosso, importante destacar que já eram vistos como uma forma de promover a educação, ainda em 1946, quando Jorge Amado propôs a emenda na Constituição para a isenção de impostos sobre eles. Existem fatores que mostram que o livro não é um produto da elite. Se você pensar nas políticas recentes de acesso ao ensino superior, encontramos jovens que, muitas vezes, representam a primeira geração de uma família a cursar uma universidade e que consomem livros, com regularidade. Isso é um sinal de democratização, algo que, num país que valoriza o conhecimento, deveria ser expandido, e não restringido.”, diz Magali Comelato, diretora da Editora Adonis.
Para Fernando Cornacchia, diretor da Papirus, em que pese uma aceleração da leitura digital, é preciso considerar que o livro, impresso, naturalmente enfrenta uma pressão por aumento de preços, e por dois motivos principais: a redução do número de pontos de venda e aumento do custo de insumos (principalmente o papel). Desta forma, acredita que “a retirada de isenções fiscais nesse momento seria um fator a mais para diminuir o acesso do público alvo ao produto.”
Ele ainda defende que a polêmica questão sobre hábitos de consumo de livros por classe social, desperta a necessidade de uma discussão mais ampla. “A educação é um fator fundamental de mobilidade social e o hábito de leitura deve sempre ser incentivado. Só há futuro possível para nosso país por meio de investimento em educação.”
José Reinaldo Pontes, da Pontes Editora também cita a educação. “Na minha opinião, isenção submete o livro à marginalidade e, em hipótese alguma, realça sua importância. Em toda Europa o livro é taxado e mesmo assim os países tem altíssimos índices de leitura. Aqui, temos reduzido número de leitores porque a educação brasileira é falha.”