O artista visual Maicongo plantou uma ideia colorida no Centro de Campinas com uma pintura de 840m² em um prédio, na qual retrata uma criança indígena no meio de livros
Em frente ao edifício com a fachada pintada, o produtor Stefan e os artistas Romeo, Semizeria, Maicongo e Teze (Divulgação)
Influenciado por sua ancestralidade indígena, o artista e muralista campineiro Maicon Gomes, conhecido como Maicongo, buscou nos povos originários e na educação impulsionada pelo hip-hop a inspiração para uma nova pintura empena que acaba de ser concluída no Centro de Campinas. Desta vez, ele e outros três artistas fizeram a pintura em um prédio localizado na Avenida Francisco Glicério, nº 1.228, na dimensão de 70m de altura por 12m de largura (no total, 840m2). A pintura, que tem um fundo laranja como a cor vibrante de identificação do artista, se destaca no meio do conglomerado de prédios da região e levou 22 dias para ser finalizada.
“Eu, como neto de indígenas nascido e criado em Campinas, me sinto honrado em presentear a cidade com uma pintura tão emblemática”, diz Maicongo. Ele destaca que o prédio não foi escolhido por acaso: está localizado na esquina da praça onde aconteceram as primeiras exibições de break dance em Campinas, no ano de 1983. “O local é considerado o início do hip-hop campineiro, palco da ação realizada pelo Malachias, o patrono dessa modalidade na cidade”, conta. O prédio também fica estrategicamente localizado entre o Marco Zero de Campinas (a praça onde fica o túmulo do Carlos Gomes) e o Marco Zero do hip-hop na cidade, acrescenta.
IMAGENS COM CONCEITOS
O título escolhido para a obra, “Raiz Fundamental”, representa para o artista três momentos: o passado, por meio da criança, com a ancestralidade dos povos originários; a leitura do livro dos Racionais (“Sobrevivendo ao Inferno”, que está na lista de leituras para o vestibular da Unicamp) como o presente que se expressa por meio da cultura hip-hop; e a pilha de livros simboliza a importância e necessidade da educação e da cultura para o futuro do Brasil. Ele também usou elementos que remetem ao lifestyle do grafite, linguagem com a qual iniciou sua conexão com a arte.
“A imagem vem de uma filosofia moderna com bases ancestrais, que liberta o pensamento das prisões impostas, há séculos, por colonizadores”, explica o artista. O projeto foi proposto por Maicongo, mas na execução ele contou com o apoio dos artistas Romeu (Gabriel Isac), Semi (Vinicius Bueno) e TZE (Thomas), todos do coletivo @galeriadasruas, além de uma equipe de apoio. O projeto da pintura foi viabilizado pelo Edital de Arte Urbana, realizado em conjunto pelas Secretarias Municipais de Cultura e do Verde, no ano passado. Empena é nome da pintura que é feita na lateral (sem janelas) de um prédio.
INTERCÂMBIO INTERNACIONAL
O coletivo @galeriadasruas é um movimento fomentado por Maicongo que tem o sonho de transformar Campinas em uma galeria de arte colorida, com artistas que trabalham nas ruas. A expectativa é que sejam pintados mais dez prédios no próximo ano. Em setembro, um grupo de três artistas do coletivo e o produtor Stefan Stenberg seguem para a Europa, onde ficam por dois meses em uma experiência de intercâmbio artístico e conexão com galerias, festivais, exposições e artistas dos países por onde passarão (Portugal, Alemanha, Espanha e Reino Unido), para aperfeiçoar técnicas e estudos sobre a estética do grafite e do mural.
Futuramente, quando o coletivo tiver sua própria galeria, a ideia é trocar materiais com esses países, conta Maicongo, que, entre 2018 e 2019, morou em Dublin (Irlanda) e Lisboa (Portugal), onde aprimorou suas técnicas. Todas essas ações, explica, “têm por objetivo desenvolver e incentivar os artistas a apresentarem seus trabalhos de maneira organizada e planejada, com inteligência, para mostrar ao público que, além do visual, existe uma narrativa, uma história contada pelas imagens. Estamos buscando nos tornar referência para esse trabalho, mostrar que o grafiteiro é um artista que precisa ser valorizado e respeitado”.
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