CULTURA

Cartão postal: uma janela para o passado

A coleção de 1.500 cartões postais do campineiro Luis Salvucci é um relicário de lembranças históricas que registra a evolução e as mudanças urbanas de Campinas

Cibele Vieira/cadernoc@rac.com.br
21/08/2024 às 15:45.
Atualizado em 21/08/2024 às 15:45

O psicanalista campineiro Luis Salvucci Rodrigues se tornou cartofilista – colecionador de cartões postais – há cerca de 10 anos, durante pesquisas pela história de Campinas antiga (Rodrigo Zanotto)

No tempo em que não existia WhatsApp, as mensagens breves eram trocadas entre pessoas de diferentes cidades por uma forma de comunicação pouco conhecida pelas gerações mais jovens: os cartões postais. Produzidos por editores especializados, que selecionavam fotografias ou desenhos escolhidos cuidadosamente, esses cartões mostravam o que havia de melhor na cidade, em séries temáticas. O psicanalista campineiro Luis Salvucci Rodrigues se tornou cartofilista – colecionador de cartões postais – há cerca de 10 anos, durante pesquisas pela história de Campinas antiga, e se apaixonou pela atividade. 

Hoje, sua coleção é formada por 1.500 cartões postais, a maioria de Campinas. As curiosidades, os fragmentos históricos presentes em cada cartão, as raridades e detalhes da pesquisa e organização serão relatados em uma palestra que Salvucci dará amanhã (dia 22), no Centro de Ciências, Letras e Artes (CCLA) de Campinas. O evento integra o ciclo “Histórias de Campinas – 250 anos”, promovido em conjunto pelo Centro e o Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas, com entrada gratuita. 

“Tem sido uma jornada fascinante, repleta de desafios e descobertas, pois a formação de uma coleção envolve muita dedicação, paixão e minuciosas pesquisas”, afirma o colecionador. 

O seu cartão mais antigo é de 1898, com uma ilustração colorida contendo imagens da Estação (atual Estação Cultura), o Teatro São Carlos e a Catedral, cuidadosamente estampadas pela técnica de cromolitografia (impressão a partir de placa de pedra). E os mais recentes são da década de 1980, com fotos coloridas dos pontos mais conhecidos da cidade, conta Salvucci, um pesquisador de histórias que faz a catalogação detalhada de todos os cartões, mas também se aprofunda nas mensagens e nas pessoas a quem eles eram direcionados. 

Foi assim que ele teve surpresas prazerosas e ficou conhecendo os descendentes de dona Antoninha, que assinava vários postais de 1905 e 1906, adquiridos por Salvucci em leilões na Internet. Ele conta que começou a postar alguns cartões dela no Facebook até que um dia recebeu uma mensagem de uma das netas. “Ela me contou a história da avó, enviou fotos, convidou para um café e até me presenteou com um quadro de dona Antoninha, que era excelente desenhista. Então, não se trata mais de ter cartões, mas de conhecer as histórias que eles contam, das famílias envolvidas, eles me permitem pesquisar e me encantar.” 

O colecionador conta curiosidades como, por exemplo, um postal assinado por Carlito Maia (médico e artista, filho do ex-prefeito Orosimbo Maia) e enviado para amigos do Rio de Janeiro, onde ele chama a atenção para a imagem do prédio do Jóquei Clube, na data em que estava sendo inaugurado (9/12/1926). Outra observação é sobre as imagens que estampam os cartões, a maioria de imóveis da região central da cidade, o que permite acompanhar as mudanças urbanas. 

Quanto aos responsáveis pelas fotos mais antigas, ele só conseguiu localizar um estúdio campineiro, a Foto Leal, que ficava na Avenida Francisco Glicério, nº 41. “Entre várias descobertas durante a formação da coleção, talvez a mais notável tenha sido a identificação de um fotógrafo amador campineiro, até então desconhecido, que também atuava como editor de cartões postais, premiado em concursos e exposições nacionais e elogiado na imprensa do País pela qualidade do trabalho”, ressalta. Vários cartões raros desse fotógrafo fazem parte da coleção e serão apresentados na palestra. 

Algumas casas comerciais lançavam suas séries de postais. Como a Casa Mascote, que ficava no Largo do Rosário, que lançou uma série com 29 cartões, relançada por um editor de São Paulo alguns anos depois. 

A coleção de Salvucci tem 31 editores identificados e 27 não identificados. A Casa Genoud foi a primeira editora de cartões-postais de Campinas, lançando dez séries. “Uma notícia de jornais da época dá conta que, em 1904, ela lançou uma série com 30 vistas da cidade e, destas, eu consegui adquirir 29”, conta. 

Campinas teve duas editoras importantes de cartões postais. Ambas foram fundadas em 1876: a Casa Genaud (que fechou em 1940) e a Casa Livro Azul (fechada em 1958). “Esse período representa o começo e o fim da iconografia mais importante da Campinas antiga”, conclui o pesquisador. A outra época dos postais foi entre os anos 1900-1920, quando se tornou “uma mania mundial”. Com a guerra e as dificuldades de insumos para impressão, a produção diminuiu, mas ainda hoje se editam cartões postais. 

A coleção de Salvucci nunca foi exposta, mas ele já iniciou conversas com o Museu da Imagem e do Som (MIS) nesse sentido. E pensa em doar a coleção para o Centro de Memória da Unicamp, para que a história e o legado dos postais sejam preservados. “O cartão postal é uma janela para o passado, um convite para viajar por locais, temas e histórias, isso me apaixona”, afirma. Ex-aluno do Colégio Culto à Ciência, ele atualmente pesquisa a história da escola pensando em futuramente editar um livro.

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