Os estudantes Lucas Amaral e Estela Melo e a aposentada Terezinha Braggion da Costa são frequentadores assíduos da Biblioteca Municipal: exemplos que ajudam a manter vivos estes espaços que estão sob ameaça de fechamento no Brasil (Dominique Torquato)
A aposentada Tereza Braggion da Costa, ou Terezinha, como insiste em ser chamada, começou a frequentar a Biblioteca Pública Municipal Prof. Ernesto Manuel Zink por acaso, em 2020. Aos 74 anos, ela está sempre lendo um livro. Estava acostumada a frequentar a biblioteca do clube em que é sócia, mas com o fechamento do lugar no início da pandemia, precisou recorrer a outras soluções para conseguir volumes novos. "As minhas amigas deixavam livros na porta de casa durante a pandemia depois que eu ligava pedindo mais, porque eu já tinha lido todos os meus", brinca, lembrando dos tempos de isolamento em que a leitura era uma de suas principais companhias. Foi quando ela decidiu conhecer melhor a principal biblioteca pública da cidade e ficou impressionada com a quantidade de opções nas estantes. "Eu lia muito Norah Roberts e Nicholas Sparks, mas agora eu tenho muito mais possibilidades e comecei a ler autores diferentes. Estou inovando e descobrindo outros", revela ela, que também adora um bom suspense, fica tensa imaginando o que vai acontecer na história e acredita que leu todos os títulos de Agatha Christie.
A Biblioteca Municipal, localizada ao lado da Prefeitura, é um dos locais de resistência na cidade e no País. Sua história remonta à algumas décadas, pois foi fundada em 1946 com a ajuda do professor Ernesto Manuel Zink depois que ele reuniu com a população 2.139 livros para o início do acervo. Hoje, mais de sete décadas depois, o espaço reúne 67.770 volumes, sendo 2.515 obras em Braille. Segundo o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), estes espaços estão reduzindo: de 2015 a 2020, o Brasil perdeu ao menos 764 bibliotecas públicas. Mas há muitos leitores em Campinas, como Terezinha, que continuam frequentando-as assiduamente e devem a elas muitas de suas leituras.
Local de estudos
A relação da pedagoga Potyra Yacatan Raimundo, de 39 anos, com a biblioteca vem de longa data. Ela tem uma carteirinha desde 1994, quando tinha apenas 11 anos e frequentava o local na época da escola. Naquele tempo, lia os clássicos literários indicados pelo clube de leitura elaborado pela professora de português. "Li 'A Ilha Perdida', 'Robinson Crusoé' e 'O Pequeno Príncipe'. Como eu não tinha muitos amigos, eu ficava na minha, lendo e viajando nas histórias", lembra. O hábito da leitura Potyra carregou para a vida adulta e mantém uma marca invejável: são, em média, cinco títulos por semana.
Hoje, como professora de Ensino Médio, ela entende que precisa estar sempre estudando e aproveita o espaço para se aprofundar dentro de suas áreas de estudo. Para "descansar", Potyra também gosta de ler ficção científica e autoajuda. A pedagoga explica que ainda está buscando caminhos profissionais, mas quer continuar crescendo. "E isso tudo eu vou conquistar lendo, estudando, me apropriando. Eu dedico o meu tempo livre à leitura e à minha carreira", compartilha, com a certeza de que a Biblioteca Municipal é uma parte importante de sua jornada.
Nova geração de leitores
Lucas Amaral e Estela Melo, ambos estudantes do Ensino Médio de 16 anos, são amigos que compartilham alguns interesses, entre eles a leitura e o gosto por frequentar a Biblioteca Municipal. O espaço é perto da casa dos jovens e da escola, então é comum saírem das aulas e se dirigirem para lá para emprestar algum volume. Na hora de escolher o que levar, as preferências são distintas. Estela gosta de livros de suspense, fantasia e romance, como os títulos "Por lugares incríveis", da autora Jennifer Niven, e a série "A seleção", de Kiera Kass. Já Lucas começou a frequentar o local depois que descobriu que lá encontraria todos os volumes do mangá “Soul Eater”, que já queria ler há algum tempo. "Eu nunca imaginei que encontraria tantas opções de quadrinhos lá. Tem muita variedade, muita coisa", conta o garoto. Ele aproveita o ambiente silencioso da biblioteca para ler ali mesmo: "É relaxante ficar ali, não tem a muvuca da escola ou até de casa".
Mas Lucas percebeu que quer dar um passo além e migrar para a leitura de livros para melhorar a interpretação de texto. Revela que leu poucos até agora, mas tem recebido o incentivo de Estela, que já indicou o volume que está lendo atualmente, o suspense "O Homem de Giz", de C.J. Tudor. Apesar de fazerem parte de uma geração adepta do livro digital, os dois valorizam a versão física, pretendem continuar frequentando a biblioteca e torcem para que sua importância seja descoberta por novos leitores. "Acho que pessoas de todas as idades deveriam frequentar as bibliotecas, porque estimulam muito nosso cérebro. Elas também poderiam receber mais investimentos, porque isso faz parte da educação", analisa a estudante.