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Quando o trabalho 'rouba' a infância

Sozinho, os números deste ano já superam os registros completos de 2015, 2016 e 2017, quando 45, 80 e 100 ocorrências foram computadas

Henrique Hein
henrique.hein@rac.com.br
13/06/2019 às 07:43.
Atualizado em 31/03/2022 às 00:28

Na semana marcada pelo Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, em 12 de junho, dados do Juizado Especial da Infância e Adolescência (Jeia) de Campinas mostram que a situação na região está longe do ideal. Somente este ano, 111 processos foram contabilizados pelo órgão entre os dias 1 de janeiro e 4 de junho. Ou seja, uma ação movida contra trabalhos infantis e de adolescentes a cada 27 horas, em média.  Sozinho, os números deste ano já superam os registros completos de 2015 (ano em que o juizado foi criado), 2016 e 2017, quando 45, 80 e 100 ocorrências foram computadas, respectivamente. Para piorar, se os índices de 2019 continuarem como estão, os dados vão superar com folga os de 2018, quando houve 215 ocorrências. Pela projeção, mais de 260 casos serão registrados até o final do ano se o ritmo atual se mantiver. Além dos dados do Jeia, o Ministério Público do Trabalho (MTP) informou que recebeu 254 denúncias de trabalho infantil nas regiões de Campinas, Jundiaí e Piracicaba, de janeiro de 2017 a maio de 2019. No mesmo período, o órgão foi informado que 59 empresas descumpriram a cota de contratação de aprendizes, uma das formas utilizadas para combater o trabalho infantil. A juíza Camila Ceroni Scarabelli, responsável pelo Jeia Campinas, explicou que as consequências do trabalho infantil na vida dos jovens são inúmeras. “O trabalho infantil prejudica a aprendizagem e aumenta a probabilidade de insucesso na vida de crianças e adolescentes que acabam abandonando a escola e se tornando vulneráveis em diversos aspectos, como a exposição à violência e ao assédio sexual”, frisou. Camila, afirma que além da perda de direitos básicos, como educação, lazer e esporte, os jovens que trabalham em locais impróprios para a idade costumam apresentar sérios problemas de saúde a médio e longo prazo. “Trabalhos que exigem esforço físico extremo, como carregar objetos pesados ou pilotar equipamentos impróprios, podem ocasionar lesões e produzir deformidades nas crianças e adolescentes”, comentou. Além dos patrões que exploram os jovens, a juiza alerta que muitas pessoas são coniventes indiretamente com esse tipo de ação, pois acreditam que o trabalho desde cedo é enobrecedor e um bom meio para educar os jovens. “Nós temos, por exemplo, muitos casos de crianças menores de 14 anos que trabalham em situação de risco com os próprios familiares, sem nenhum tipo de proteção. Isso é inaceitável” , comentou. Como denunciar Para denunciar crimes contra o trabalho infantil, basta comparecer a um fórum trabalhista. A denúncia será cadastrada no sistema por um servidor. De acordo com Camila, os processos de trabalho infantil e adolescente têm prioridade de julgamento e costumam tramitar mais rápido do que os processos de trabalhadores adultos pelo simples fato de ter um juizado especializado por trás do caso. País tem quase 2,5 milhões de menores trabalhando Atualmente, o Brasil tem quase 2,5 milhões de crianças e adolescentes entre cinco e 17 anos trabalhando, segundo o IBGE. Eles estão na agricultura, pecuária, em comércio, domicílios, nas ruas, em construção civil, entre outros setores. As regiões Nordeste e Sudeste registram as maiores taxas de ocupação, com 33% e 28,8% dessa população de meninos e meninas trabalhando, respectivamente. Nessas regiões, em números absolutos, os estados de São Paulo (314 mil), Minas Gerais (298 mil), Bahia (252 mil) e Maranhão (147 mil) ocupam os primeiros lugares no ranking . Desde 2013, vem aumentando no País os casos de trabalho infantil entre crianças de cinco a nove anos. Em 2015, último ano de pesquisa do IBGE, quase 80 mil crianças nessa faixa etária estavam trabalhando e, nas próximas pesquisas, quando estiverem mais velhas, poderão promover o aumento do número de adolescentes que trabalham. Aproximadamente 60% delas vivem na área rural das regiões Norte e Nordeste. A manutenção do trabalho infantil se dá, em grande parte, pela cultura enraizada em nossa sociedade de que é melhor a criança ou adolescente trabalhar do que estar na rua. Ainda existe o mito de que trabalho infantil ensina valores morais. "Quando uma criança trabalha, diminui o seu tempo disponível para convivência familiar, para brincar, estudar e aprender. O trabalho infantil é a porta de entrada para as demais violações de direitos" diz Carmen Lucia Miranda Silvera, assessora técnica do Ministério da Saúde e responsável pelas ações de erradicação do trabalho infantil. Na condição de aprendizes, em 2018, o Brasil contratou mais de 444 mil adolescentes. 15% a mais em relação a 2017, de acordo com as secretarias do Ministério da Economia. Porém, ainda existem mais de 510 mil potenciais vagas que deveriam ser destinadas a aprendizagem nas empresas. De 2014 até março de 2019, foram 1.460 ações ajuizadas e 2.746 termos de ajustamento de conduta (TACs) firmados envolvendo o tema aprendizagem.

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