Filme conta como uma casa erguida com restos de construção virou ponto de encontro de artistas
Não é apenas uma casa. É quase um castelo. Na prática, um experimento arquitetônico sensacional, erguido ao longo da década pelo estatístico Fernando Caleffi, morador do Parque das Universidades. Como as intervenções e improvisos nunca terminam, a construção se transformou em um mosaico da Campinas de todas as épocas. O mais curioso, no entanto, é que o imóvel serve hoje de ponto de encontro de poetas, cineastas, cantores, declamadores. E o registro desses saraus virou um filme de 30 minutos, lançado para integrar o acervo de centros culturais e universidades brasileiras e portuguesas.
Pedras que Falam, do diretor Fernando Figueirinhas, foi gravado ao longo de um ano. Quando conheceu o imóvel, na década passada, ele se encantou. Viu portões do começo do século passado, paralelepípedos usados na pavimentação de ruas históricas. Se impressionou com a riqueza das imagens, quadros, altares, fontes, colunas sulcadas, capitéis. Material que um dia, no passado distante, decorou mansões, capelas, grades fazendas cafeeiras.
As peças, notou, remetiam a escolas estéticas de todos os tempos. Aquele era o ambiente perfeito para o filme. E o diretor se entregou à aventura de gravar sem um tostão no bolso. Contou com equipamentos improvisados e protagonistas voluntários.
Mas se a produção é tecnicamente artesanal, o conteúdo é primoroso. Ali foram reunidas as vozes de Niza Tank e Alcides Acosta, importantes cantores líricos campineiros. Há o violino sensível de Gláucia Peruchi; declamações impecáveis de Marília Bestani e Camila Biebow. O próprio dono da casa, Fernando Caleffi, emociona declamando trechos de poemas de Fernando Pessoa.
A interpretação de músicas e textos clássicos acontece em um lugar que se é uma síntese da história da cidade. Por aquelas pedras já passaram juízes, padres, meretrizes, escravos, semilionários, miseráveis. As peças dispostas cuidadosamente documentam as alegrias e tristezas das gerações que foram se sucedendo na história da cidade. A edição teve o capricho de mostrar paisagens históricas e fotos de personalidades campineiras.
O filme foi lançado em junho, no Museu da Imagem e do Som (MIS). E os mil exemplares da primeira edição serão distribuídos em escolas, bibliotecas, museus. “Um encontro de amigos acabou fazendo do castelinho um centro de difusão cultural. Como hoje em dia a cidade investe muito pouco em cultura, os artistas se encarregaram de improvisar um palco, criar o próprio espaço para as apresentações”, fala o diretor.
Historiador na internet
Português da cidade do Porto, Fernando Figueirinhas, nasceu em 1952, mas desde a mocidade vive no Brasil. Administrador de empresas, ele se mudou para Campinas há 15 anos. Mas foi um cineasta autodidata. Na carreira, ele gravou, por exemplo, diversos documentários sobre movimentos culturais. Também se tornou escritor. O cidadão trabalha em um estúdio improvisado nos fundos da própria casa, no Jardim Chapadão, onde dividem espaço livros, fotos antigas, gravuras, quadros, castiçais.
O curioso é que aquele senhor, apaixonado pela História, foi “capturado pela modernidade”. Ele começou a postar seus poemas no Facebook, e conseguiu arrumar um time respeitável de amigos virtuais. E entre eles estava Mizé Fernandes, licenciada em filologia da Faculdade de Coimbra.
A amiga apresentou seus versos à Lua de Marfim, uma editora portuguesa. A urgência da mudança é um compêndio de 37 poemas tratando do comportamento humano. Um dos textos é exatamente o poema em prosa Pedras que Falam, que inspirou a gravação e deu nome ao filme sobre o castelinho.
SAIBA MAIS
As pessoas interessadas em sabe detalhes sobre a produção do filme podem acessar o site www.pedrasquefalam.com
Contatos com o diretor português radicado em Campinas podem ser feitos por meio do endereço eletrônico fernandofigueirinhas@hotmail.com
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