TRADIÇÃO

O bom e renovado hábito de ler no papel

Leitores ainda preferem consumir jornais impressos do que as versões em mídias digitais

Raquel Valli/ Correio Popular
raquel.valli@rac.com.br
25/01/2021 às 14:48.
Atualizado em 22/03/2022 às 10:46
Ademir Mina Falsarela, dono da tradicional Banco do Alem?o no centro de Campinas: jornaleiro come?ou a vender jornais na rua aos sete anos (Importação)

Ademir Mina Falsarela, dono da tradicional Banco do Alem?o no centro de Campinas: jornaleiro come?ou a vender jornais na rua aos sete anos (Importação)

A história das bancas de jornais se funde com a de Campinas. Uma das mais tradicionais da cidade, a Banca do Alemão, que funciona no centro desde 1951, recebe até hoje, diariamente, leitores fieis que compram jornais diários e revistas a fim de lê-los pela edição impressa. Esse antigo e cultuado hábito de ler uma publicação em papel ainda resiste em tempos de mídias digitais, redes sociais e internet.

E quem pode dar um testemunho muito interessante sobre isso, é o dono desta tradicional banca, Ademir Mina Falsarela, 70 anos, que até hoje lê jornais e outros periódicos somente no papel. Ele não quer nem saber de internet e também não sente falta destas novas tecnologias.

Falsarela recorda dos tempos de menino quando vendia jornais na rua. Com saudades daquela época, o jornaleiro conta como começou a trabalhar nesse ramo: "Comecei a vender jornal, como o Correio Popular, quando eu tinha sete anos. Vendia na rua. Naquela época, mal existia TV. Eu corria pro Correio de manhã, entrava no prédio da Conceição, e pegava o fardo ali mesmo onde era rodado. Com isso, vi Campinas crescer. E eu gostava de ler sobre esporte e de ver a seção policial, porque ali não tinha quase nada. Era um tempo muito diferente de hoje", recorda.

Falsarela relembra que as maiores vendas de jornais aconteciam em épocas de copa do mundo, especialmente as de 1958, 1962 e 1970, quando o Brasil conquistou as três primeiras copas, na Suíça, no Chile e o tri-campeonato no México, épocas em que Pelé e Garrincha brilhavam nos campos de futebol. "Vendemos muito nas copas de 1958 e 1962, mas, sobretudo, na de 1970, quando o Brasil foi tricampeão", pontua.

Entre os clientes famosos, Falsarela recorda quando a banca era freqüentada pela atriz Maitê Proença, ainda criancinha, e era levada pelo pai para comprar revistas infantis. Outro cliente famoso era o apresentador Fausto Silva, da Rede Globo, que adorava comprar revistinhas no estabelecimento, quando moleque. 

Progresso

E a banca, assim como Campinas, expandiu-se. O fundador Ângelo Falsarela foi até Santa Bárbara d'Oeste para encomendar uma estrutura nova, mais moderna e confortável para os clientes. Quando ela chegou e foi instalada, fiscais da prefeitura não a aprovavam por ter ficado muito grande e fora dos padrões exigidos na época. "Mas, nós a montamos mesmo assim”, confessa.

Preocupado com a ação dos fiscais, um fato iria surpreender o jornaleiro e marcar para sempre a sua vida e trabalho naquele pedaço do centro da cidade. Uma visita ilustre acabou por selar a permanência no local, agora com as novas dimensões, naquele espaço onde se encontra até hoje.

“No dia seguinte à instalação da nova banca, Magalhães Teixeira (ex-prefeito de Campinas) estava andando do outro lado da rua e ficou observando. Então, o 'Grama' a atravessou e falou pro meu pai: - ficou uma maravilha! Você iluminou a praça”, recorda.

Ademir conta a história chorando, emocionado. "Magalhães foi o último bom prefeito de Campinas. Ele andava muito sozinho na rua. Era amigo da gente", relembra com saudades.

Desde sempre

A aposentada Sônia Giubilei tem 82 anos e lê jornais desde quando cursava a faculdade de pedagogia. "Isso vai longe. Papai assinava jornal quando era vivo e eu passei a assinar também. De manhã, o jornal chega e eu já leio. O que mais gosto é de colunas. Não tenho hábito de ler pela internet porque complica ficar lendo na tela. TV nem se fale. É distração. Cultura é jornal".

Aparecida do Carmo S. de Almeida, 66 anos, também prefere a leitura pelo impresso. "Eu assino jornais porque gosto de ler. Tomo meu café lendo jornal. Esses dias está meio corrido porque estou olhando o meu neto, mas eu não deixo de ler. E o meu marido também gosta. Só que ele lê pela internet. Eu assino, então estou sempre lendo. Na internet tem tudo, mas eu gosto mesmo é de ler no impresso".

O publicitário Guilherme Ferrrari tem 30 anos. Mas, também prefere ler pelo papel. "Não tem comparação. A leitura pela internet é ágil, mas não se compara com o impresso. A gente pode sentir com o tato, folhear, sublinhar as palavras e as frases mais importantes".

Ferrari adquiriu o hábito da mãe, a protetora de animais Marinês Silva, 50 anos. "Leio pela internet também, mas não é a mesma coisa. Gosto mesmo é do papel. Você senta, abre o jornal, folheia e volta a página. Relê o que mais te interessou e ainda pode recortar e guardar. Antes, eu recortava mais. Hoje quase não faço isso porque a vida anda muito corrida. Mas, sinto falta. É muito gostoso".

O advogado Márcio Ramos começou a ler jornal ainda criança, na casa da avó. O hábito, passado de geração em geração, se perpetuou na família. Já adulto, cursando direito, lia jornais na biblioteca do Palacete do Solar do Barão de Itapura (onde ficava o campus central) da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).

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