Beth Sahão (PT) e Leci Brandão (PCdoB) enviaram questionamentos à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado; subsecretário afirmou que estudos estão em fase inicial
Subsecretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Orlando Melo de Castro, afirmou que estudos estão em fase inicial; possibilidade de comercialização envolve uma gleba da Fazenda Santa Elisa que abriga exemplares únicos de diversas espécies de café (Alessandro Torres)
O possível desmembramento e venda de partes da Fazenda Santa Elisa, pertencente ao Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e principal centro de pesquisa do café no país, enfrenta uma forte resistência em várias frentes. Uma delas é liderada por deputados da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). Outra, por integrantes da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC).
A deputada estadual Beth Sahão (PT) enviou um ofício ao secretário de Estado da Agricultura e Abastecimento, Guilherme Piai, para que a Pasta informe detalhes do processo de mapeamento e desmembramento de áreas públicas de pesquisa que seriam destinadas à venda, incluindo a Fazenda Santa Elisa. “A referida área possui uma importância ambiental muito grande, visto a existência de renascentes do cerrado, nascentes, córregos, represa, além da grande importância histórica e cultural”, afirmou a presidente da Frente Parlamentar em Defesa das Universidades Públicas e Institutos de Pesquisa, deputada estadual Beth Sahão (PT), autora do requerimento.
No documento publicado na edição de ontem, dia 13, no Diário Oficial do Estado, a deputada questiona se a Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp) realizou estudo para desmembramento da área do IAC e de outras fazendas experimentais do Estado. “Sendo referida área patrimônio científico, é indispensável que qualquer ato administrativo que pretenda a transferência ou alienação da mesma ocorra com a prévia aprovação da Assembleia Legislativa”, disse Beth Sahão no texto. A Secretaria tem 30 dias para responder os questionamentos do requerimento, de acordo com o regimento interno da Assembleia.
Ainda na Alesp, a deputada estadual Leci Brandão (PCdoB) também enviou um ofício ao secretário de Estado da Agricultura e Abastecimento com questionamentos à Pasta sobre o mesmo tema do requerimento criado pela deputada do PT. Já a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo reivindicou a valorização da pesquisa pública em carta aberta à Secretaria de Agricultura e Abastecimento. O documento foi entregue presencialmente no final de outubro ao secretário Guilherme Piai durante o lançamento do programa Canephora, voltado para a cadeia cafeeira, realizado no IAC. Dezenas de pesquisadores concursados participaram do ato e relembraram a possibilidade da venda da Fazenda Santa Elisa.
No documento, os cientistas destacam a existência de uma diferença salarial gritante no Estado na comparação com carreiras similares federais em instituições como a Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), além de uma perda salarial de 54,19% nos últimos 11 anos. Os assinantes da carta reivindicam, entre outros pontos, um reajuste salarial real, digno e imediato, e que os benefícios, como a licença-prêmio, sejam mantidos. Eles também são contrários à reestruturação das carreiras, solicitando um reajuste salarial digno e imediato.
DEFESA
O subsecretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Orlando Melo de Castro, esteve ontem em Campinas, dia 13, durante um evento no IAC que homenageou pesquisadores do segmento cafeeiro e suas famílias. Em entrevista, ele afirmou que os estudos para uma possível venda de partes da Fazenda Santa Elisa e de outras áreas estão em fase inicial. “Aquilo que for prioridade para pesquisa, seja para conservação de coleções de germoplasma ou de pesquisas em andamento, não será alterado. No entanto, as áreas que possam ser disponibilizadas para venda, de modo a reduzir custos de manutenção, de segurança, entre outros, e que gerem também uma receita para financiamento de pesquisas, assim serão”, declarou.
Após a entrevista, em fala durante a abertura do evento, ele não citou especificamente a questão da Santa Elisa, mas negou que haja um desmonte quando se trata dos profissionais de pesquisa, afirmando que eles serão valorizados pelo Governo de São Paulo. “Precisamos de mais gente para pesquisar tudo isso, seja através dos nossos cursos de pós-graduação com jovens, aqui e nos demais institutos, fazendo pesquisas, muito bem orientados pelos nossos pesquisadores, seja com o ingresso de novos pesquisadores. O governador Tarcísio está atento a isso. Esse conjunto de medidas é que vai, mais do que tudo, fortalecer as nossas instituições.”
O fundador da Daterra, empresa organizadora do evento, Luis Norberto Pascoal, também falou na abertura. Ele reforçou a importância dos pesquisadores e defendeu a existência do IAC, sendo aplaudido durante o ato. “Se for preciso, eu vou enfrentar o Governo do Estado para defender o IAC. O instituto, para a história brasileira, é intocável. Não é a terra. É a filosofia. É um processo de acreditar no país, acreditar na ciência”, afirmou.
A Secretária de Estado da Agricultura e Abastecimento, em nota, reforçou que as "áreas que possuem pesquisa em andamento não serão objeto de alienação ou desmembramento e que a Pasta mantém diálogo aberto com entidades, associações e com as partes relacionadas à questão", além de dizer que somente após a conclusão dos estudos é que será definida qual ação será tomada.
HISTÓRICO
O Correio Popular revelou na edição do dia 17 de outubro a história da possível comercialização, algo que envolve uma gleba de sete hectares do centro experimental, denominada São José, que representa pouco mais de 1% da área total. Esse terreno abriga exemplares únicos de diversas espécies de café, incluindo a população mais antiga do mundo da variedade arábica clonada por cultura de tecidos. A fazenda ocupa 692 hectares em área urbana, equivalente a 989 campos de futebol, e desde 1932 desenvolveu variedades que hoje representam 90% do café cultivado no Brasil, líder mundial na produção.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), manifestou-se no último dia 23 de outubro favorável à venda de áreas subutilizadas da propriedade. Ao mesmo tempo, ele defendeu a preservação das áreas onde são realizados estudos científicos.