O Guia do Eleitor foi lançado pelo coletivo Casa Hacker, uma organização da sociedade civil criada há dois anos no Parque Itajaí (Cedoc/RAC)
No mundo em que estar conectado é condição elementar para se manter inserido na sociedade, os perigos que nos rondam chegam pelos equipamentos tecnológicos que utilizamos todos os dias — e cada vez mais. O risco pode estar em nossas mãos, pelo celular, o computador ou qualquer conexão ao universo digital. Com o objetivo de educar sobre segurança midiática e ensinar o cidadão a proteger seus dados e sua privacidade no dia a dia e, especialmente, em ano eleitoral, o coletivo Casa Hacker (@casahacker), uma organização da sociedade civil criada há dois anos no Parque Itajaí, em Campinas, lançou esta semana o Guia do Eleitor com sete dicas práticas de como se proteger da coleta de dados pessoais sem o devido consentimento ou conhecimento. Lançado no último dia 22 e disponibilizado gratuitamente pela internet (http://casahacker.org/guiadoeleitor), o projeto independente foi elaborado em parceria com a Tactical Tech, uma organização alemã sem fins lucrativos que realizou uma pesquisa em diversos países sobre como funciona a coleta de dados pessoais pelas empresas ou campanhas políticas. O material didático adaptado para o Brasil pela Casa Hacker resultou no Guia do Eleitor. Em três dias, o guia teve mais de mil acessos e muitos comentários. Para amenizar os efeitos da overdose tecnológica e da invasão de privacidade, a orientação básica é fazer uma frequente limpeza de dados e criar boas práticas no mundo hiperconectado em que vivemos. “Nós acreditamos que a proteção dos nossos dados pessoais só vai acontecer de forma efetiva a partir desta limpeza, como um detox, para impedir que novos dados sejam gerados. Isso envolve a adoção de boas práticas”, explica Geraldo Barros, técnico em Informática e tecnólogo, um dos criadores do coletivo Casa Hacker na Casa de Cultura Itajaí, em 2018, que também participou da elaboração do guia que teve início no final de 2019. “São sete dicas de como fazer um detox de dados”, apresenta Barros. De forma didática, o guia dá o passo-a-passo para cada uma das sete dicas: mude sua rotina, mude suas preferências nas redes sociais, bloqueie seu celular e navegadores de desktop, mantenha-se informado, limite quem sabe onde você está, fale (faça sua voz ser ouvida); conte à sua comunidade (compartilhe as dicas). “Não apenas mostramos como estes dados são utilizados, mas damos dicas diretas de como a pessoa pode impedir que estes dados sejam roubados. A ideia é chegar à raiz do problema”, afirma Barros. O objetivo do guia, de acordo com Barros, é educar a comunidade sobre a proteção dos seus dados, um direito violado inclusive por muitas empresas, “e no período eleitoral não é diferente, onde os dados são coletados, analisados e usados para influenciar diretamente o eleitor, por meio de manipulação do entendimento público do processo democrático.” Driblando Para o professor de informática do Instituto Federal (IFSP), unidade Campinas, André Luís Bordignon, o Guia do Eleitor traz questões importantes que muitas vezes nos escapam, em função do uso constante das tecnologias. Ele soube do guia pelas redes sociais e teve interesse imediato, tanto por razões pessoais quanto profissionais. “Nada é gratuito no mundo conectado”, alerta Bordignon. “Quando você cria um e-mail, tudo parece gratuito, mas muita gente não sabe que está disponibilizando dados. O guia nos alerta sobre a utilização das nossas informações pessoais. É importante lembrar que nas eleições deste ano será permitido patrocinar conteúdo de propaganda eleitoral”, alerta o professor. Bordignon fala que uma das dicas importantes do guia é aprender a “enganar” as redes sociais. “Pode ser difícil às vezes, mas é preciso enganar os algoritmos, burlando suas preferências, porque estamos muito vulneráveis quando disponibilizamos nossos dados. Por isso é importante você ter consciência.” Na opinião de Bordignon, a falta de transparência sobre estes processos é um dos maiores problemas. O GUIA DO ELEITOR 7 dicas de como proteger sua privacidade DICA #1: Mude sua rotina; DICA #2: Mude suas preferências nas redes sociais; DICA #3: Bloqueie seu celular e navegadores de desktop; DICA #4: Mantenha-se informado; DICA #5: Limite quem sabe onde você está; DICA #6: Fale (faça sua voz ser ouvida); DICA #7: Conte a sua comunidade (compartilhe). Assunto também é discutido em lives O Guia do Eleitor também disponibiliza outros links, como a vídeo galeria “Dados Pessoais: Persuasão Política — O que está à venda?” (http://casahacker.org/fala-hackers/2020/6/19/dados-e-poltica-por-dentro-da-indstria-da-influncia). De forma ilustrativa, o vídeo mostra como funciona a indústria da influência, que usa ferramentas de marketing legítimas para manipular. A Casa Hacker (http://casahacker.org/) também tem realizado uma série de lives no Instagram sobre o assunto. “Nós percebemos que este é um tema muito novo para as pessoas. Ficam todos chocados porque não acham que o fato de apoiarem um político ou outro vai afetar diretamente as campanhas políticas. As pessoas não têm noção, por exemplo, que o fato de curtir um cantor ou uma causa faz com que as campanhas políticas direcionem propagandas personalizadas”, explica Geraldo Barros, técnico em Informática e tecnólogo. De acordo com o tecnólogo, que desde os 15 anos trabalha com cultura digital, neste período de pandemia o coletivo Casa Hacker tem recebido muito apoio voluntário de pessoas ligadas a pesquisas. Desde 2018 quando foi criada, a Casa Hacker funciona na Casa de Cultura Itajaí, da prefeitura de Campinas, como uma organização 100% sem fins lucrativos que trabalha com inclusão digital, promovendo cursos e oficinas acessíveis para o terceiro setor, além de contar com parcerias que investem em cursos, treinamentos e consultorias a empresas, viabilizando a monetização do trabalho e manutenção do projeto. O foco é a educação e cultura digital para as comunidades locais periféricas, e a defesa dos direitos digitais. Educação tecnológica O primeiro grande apoiador da Casa Hacker foi a Fundação das Entidades Assistenciais de Campinas (Feac), lembra Barros. No ano em que o coletivo se organizou, acontecia a campanha eleitoral para presidente. “Criamos o coletivo pra fazer educação tecnológica e midiática. Naquele momento estávamos passando por um período de eleição. A gente viu como a comunidade estava sendo manipulada pelas redes sociais, isso foi o que moveu a Casa Hacker”, conta o tecnólogo. O coletivo montou um laboratório de tecnologia dentro da Casa de Cultura Itajaí e começou a fazer programas de educação digital, como oficinas, cursos de inclusão e alfabetização digital para quem tinha pouco ou nenhum conhecimento de tecnologia, além de projetos sobre privacidade e segurança midiática. “Porque sabemos que a privacidade e a segurança de todas as pessoas estão em risco”, afirma Barros. As atividades são voltadas para pessoas a partir dos 13 anos. Segundo Barros, a maior parte do público é formada pelas comunidades do Itajaí, Campo Grande e Ouro Verde, mas há também a participação de moradores de outros bairros.