QUADRO PREOCUPANTE

Epidemia de dengue em 2025 pode ser ainda pior do que a deste ano

Prefeitura de Campinas divulgou novas estratégias para combater o vírus e conclamou a população a fazer a sua parte na “guerra” declarada contra a doença

Edimarcio A. Monteiro/edimarcio.augusto@rac.com.b
22/11/2024 às 14:21.
Atualizado em 22/11/2024 às 15:29
Diretora do Devisa, Wanice Silva Quinteiro Port mostra na primeira imagem o gráfico com o número de casos ano a ano, evidenciando quão grave
foi e ainda é a epidemia em 2024 (última e maior coluna) (Rodrigo Zanotto)

Diretora do Devisa, Wanice Silva Quinteiro Port mostra na primeira imagem o gráfico com o número de casos ano a ano, evidenciando quão grave foi e ainda é a epidemia em 2024 (última e maior coluna) (Rodrigo Zanotto)

A Prefeitura de Campinas declarou guerra à dengue diante da previsão de enfrentar em 2025, um quadro igual ou pior ao deste ano, quando registrou o recorde de 80 mortes em 120.475 casos confirmados até ontem. É a pior epidemia desde 1998, início da série histórica, superando com folga 2015, até então o pior ano com 22 óbitos e 65.754 notificações positivas.

“É uma declaração de guerra. Quem viveu a epidemia deste ano, com mais de 120 mil casos, sabe o que foi”, disse o prefeito Dário Saadi (Republicanos) ao anunciar novas medidas de combate à doença, incluindo uso de imagens de satélite da Polícia Federal para localizar imóveis com grandes quantidades de criadouros, uso de Inteligência Artificial (IA) para ampliar a vacinação, busca de apoio de lideranças de bairros, comunidades religiosas, empresas, entidades de classe e identificação, com placa ou cartaz, dos imóveis onde não foi possível fazer vistoria, seja por ausência dos moradores ou por proibição de entrada dos agentes de saúde.

“Nós não queremos discriminar a casa. Queremos identificar e pedir ao morador que olhe no seu quintal, na sua casa, nas suas plantas para verificar se não há água parada”, destacou o prefeito. A água parada em ralos, pratos de vasos de plantas, caixas d´água, garrafas, potes, piscinas e outros locais servem de criadouro do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, zika e chikungunya.

De acordo com a diretora do Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa), a médica sanitarista Wanice Silva Quinteiro Port, vários fatores indicam o risco de uma epidemia de dengue mais grave no próximo ano: o grande número de pacientes com a doença em 2024, com a reinfecção podendo ser responsável por um aumento de casos graves; volta da circulação do vírus da dengue tipo 3, que não era identificado na cidade desde 2009; mudanças climáticas, com o aumento das ondas de calor, reduzindo o período de desenvolvimento do mosquito de 36 para menos de 8 dias; e aumento da incidência do Índice de Breteau, utilizado na avaliação da densidade larvária do Aedes aegypti, no período de inverno, quando naturalmente a incidência deveria cair. “Esse cenário é bastante preocupante. Nós tivemos em 2024 a circulação de três sorotipos aqui em Campinas, os sorotipos 1, 2 e 3”, alertou Wanice Port. Em julho deste ano, a cidade registrou o Índice de Breteau de 0,44 larvas do mosquito por imóvel vistoriado, enquanto no mesmo mês de 2023 o valor numérico verificado foi de 0,30.

REFLEXO PERIGOSO

No período de inverno e início de primavera de 2024, mais especificamente entre 1º de julho e 9 outubro, o município registrou 3.670 casos de dengue, número 5,5 vezes superior aos 662 de igual período do ano anterior, de acordo com balanço divulgado pela Prefeitura. O secretário municipal de Saúde, Lair Zambon, alertou que uma nova epidemia de dengue coloca em risco a capacidade da rede de saúde de lidar com o aumento da demanda. “Não deixamos de atender nada em 2024, mas sempre há prejuízos na assistência a outras patologias e nos preocupamos. Ainda temos demandas reprimidas da pandemia (de covid-19), principalmente doenças crônicas. A epidemia prejudica a atenção primária e hospitalar.”

A Prefeitura também informou que usará o chatbot para enviar mensagens à população com o objetivo de ampliar a vacinação das crianças de 10 a 14 anos, público definido pelo Ministério da Saúde para imunização contra a dengue. Das 17.724 crianças e adolescentes que tomaram a primeira dose da vacina, apenas 6.428 voltaram para tomar a segunda, fator importante para garantir a eficácia da imunização. O chatbot é um assistente virtual que usa Inteligência Artificial e programação para se comunicar por texto com usuários. Essa ferramenta será usada inicialmente para enviar mensagens de convocação para que 9.252 crianças e adolescentes tomem a segunda dose. Outras 2.044 pessoas tomaram a primeira e precisam aguardar o ciclo mínimo de 3 meses para completar o esquema vacinal.

O número de crianças e adolescentes com as duas doses ficou muito abaixo do público-alvo. Até o momento, apenas 9,8% das 65.265 pessoas da cidade na faixa etária definida para receber as doses estão imunizadas com o esquema completo. Segundo a prefeitura, a vacina garante uma eficácia de proteção de 80,2% por 12 meses após a segunda dose. A eficácia para evitar hospitalização por dengue é de 90,4%. Campinas registrou neste ano dois óbitos entre pessoas de 6 a 17 anos. Das 80 mortes, 30 foram de pessoas com mais de 80 anos, o equivalente a 37,5% do total.

SEMANA DE MOBILIZAÇÃO

Campinas realiza atualmente a Semana de Mobilização Contra a Dengue. A programação inclui trabalho de conscientização em escolas, supermercados e mutirão amanhã, sábado (23), no Parque Oziel e em outros sete bairros da região. O Oziel registrou 1.662 pessoas com a doença neste ano, uma incidência de 12.816,8 casos por grupo de 100 mil habitantes.

O prefeito Dário Saadi ressaltou que é importante que a Prefeitura faça o seu trabalho e classificou como fundamental a participação da população nesse esforço. “Não tem outra solução para que a gente possa reduzir os casos e não ter uma epidemia com os números que tivemos agora em 2024.” Ele defendeu, principalmente, que a população se engaje no combate aos focos do Aedes Aegypti, realizando vistorias nas residências para acabar com os criadouros pelo menos uma vez por semana e permitindo a entrada dos agentes de saúde nos mutirões em bairros.

Nos mutirões realizados neste ano, eles foram impedidos de entrar em 52% dos aproximadamente 1,4 milhão de imóveis visitados. O prefeito afirmou que será mantido o trabalho em parceria com chaveiros para entrar em imóveis fechados com forte suspeita de criadouros. “Não adianta eu cuidar da minha casa se o vizinho não fizer a parte dele”, opinou a dona de casa Rosena da Silva Cunha, que teve dengue. Ela reside na região do Parque Valença, que registrou o maior número de casos confirmados de dengue em 2024, 3.669 registros. “Achei que ia fazer uma visita ao 'Criador'. Passei muito mal. Não conseguia comer, tinha muito dor e suava frio”, contou Rosena Cunha, que ficou três dias internada.

“Eu já recebi muitas visitas dos agentes de saúde e procuro fazer a minha parte, que é evitar o acúmulo de água em casa”, pontuou outra moradora do Valença, a dona de casa Marisa Santana. Já a psiquiatra Beatriz Pereira não baixa a guarda nem morando em apartamento. “Não deixo acumular água nos pratos dos vasos, em ralos e outros locais. Em apartamento é mais fácil cuidar, mas faço a minha parte.” 

A Prefeitura informou que trabalhará junto a comunidades religiosas e lideranças de bairros para aumentar o engajamento no combate aos criadouros do Aedes aegypti. Ela também fará parceria com imobiliárias e o Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci) com o objetivo de identificar criadouros de larvas do mosquito em imóveis fechados que estão disponíveis para locação ou venda. A Administração também buscará uma parceria com a concessionária CPFL para fazer a identificação de casas com criadouros e enviar mensagens educativas por meio de contas de energia, além de realizar campanha publicitária em várias mídias.

O verão, que começa em 21 dezembro e intensificará as chuvas e o aumento da temperatura, cria um cenário ideal para a procriação das larvas do mosquito. De acordo com a Defesa Civil de Campinas, em 2022 foram três alertas de altas temperaturas, número que subiu para 39 no ano seguinte e em 2024, mesmo antes do término do ano, já chegou a 66. “Essa onda de calor é preocupante por causa dos incêndios, mas também é uma questão de saúde pública. Nos preocupa bastante a possibilidade de situação de emergência na região”, admitiu o diretor da Defesa Civil de Campinas e coordenador regional, Sidnei Furtado.

NOVAS AÇÕES AGREGADAS EM 2025

✔ Colocação de aviso nas residências em que as equipes não conseguem entrar;
✔ Capacitação de lideranças de bairros;
✔ Reunião com as comunidades religiosas;
✔ Reunião com representantes do Creci para fiscalização em imóveis vazios Uso de chatbot para diminuir a pendência (casas fechadas) das visitas das equipes;
✔ Intensificação do trabalho do Grupo de Resposta Unificada (GRU);
✔ Uso de imagens de satélite da Polícia Federal para localizar imóveis com grande quantidade de criadouros (pedido enviado à instituição);
✔ Uso de chaveiros para entrar em casas com forte suspeita de criadouros e uso de drones;
✔ Parceria com a CPFL na identificação de casas com criadouros e mensagens educativas nas contas de energia;
✔ Realização de mutirões nas áreas com alta transmissão da doença;
✔ Uso de chatbot para aumentar a cobertura da vacina contra a dengue;
✔ Campanha publicitária educativa em diversos canais de comunicação;
✔ Capacitações para profissionais de saúde das redes pública e privada;
✔ Reunião com representantes dos hospitais privados;
✔ Reforço no estoque de insumos utilizados no tratamento de dengue e chikungunya.

Fonte: Prefeitura de Campinas

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