TRÊS EM CADA CINCO

Campinas possui mais de 400 mil carros cadastrados para transporte de passageiros

Mais de 60% dos automóveis licenciados na cidade contam com autorização para prestar esse serviço via aplicativos

Edimarcio A. Monteiro/edimarcio.augusto@rac.com.br
09/01/2025 às 12:31.
Atualizado em 09/01/2025 às 14:47
Campinas possui 251.739 motoristas cadastrados pelos aplicativos e autorizados a fazer o transporte de passageiros, crescimento de 71,42% em relação a 2022; ao todo, são 641.583 carros licenciados na cidade até novembro, de acordo com a Senatran, sendo que 405.957 possuem permissão para utilização nesse tipo de serviço (Rodrigo Zanotto)

Campinas possui 251.739 motoristas cadastrados pelos aplicativos e autorizados a fazer o transporte de passageiros, crescimento de 71,42% em relação a 2022; ao todo, são 641.583 carros licenciados na cidade até novembro, de acordo com a Senatran, sendo que 405.957 possuem permissão para utilização nesse tipo de serviço (Rodrigo Zanotto)

A cada cinco automóveis em Campinas emplacados, três estão autorizados a serem utilizados em aplicativos de transporte de passageiros. A proporção é revelada pelo cruzamento de dados de órgãos oficiais atuantes nessa área. O município tem hoje 405.957 carros cadastrados a prestar esse serviço, de acordo com a Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec), o equivalente a 63,27% da frota de 641.583 automóveis licenciados até novembro, número mais recente disponibilizado pela Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), vinculada ao Ministério dos Transportes. A cidade possui ao todo 991.086 veículos, incluindo todos os tipos: ônibus, caminhões, motocicletas, triciclos, reboques e outros.

Os dados da Emdec mostraram um aumento de 88,26% no número de veículos cadastrados para trabalhar em aplicativos em dois anos. Em 2022, eram 215.634. No entanto, o número de carros autorizados não reflete a quantidade que está de fato circulando na cidade no transporte de passageiros, pois muitos podem estar cadastrados, mas não serem utilizados. Além disso, os motoristas podem ter mais de um carro registrado.

Já o número de condutores cadastrados pelos aplicativos junto à empresa responsável pelo gerenciamento do sistema de transporte e trânsito de Campinas teve alta de 71,42% no mesmo período. Ele passou de 146.865 para 251.739. Ou seja, o número de motoristas autorizados é maior do que a população de 613 municípios paulistas, considerando que apenas 32 cidades no Estado têm mais de 251 mil habitantes, de acordo com o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

MERCADO DE TRABALHO

Apenas o aumento de 104.874 condutores cadastrados no período supera a população de 11 dos 20 municípios da Região Metropolitana de Campinas (RMC). Vinhedo, a primeira cidade nesse recorte, tem, por exemplo, 76.450 moradores. Para o economista Fábio Bentes, o crescimento de motoristas vinculados a aplicativos ocorre em função do mercado formal não ser capaz de absorver todos os trabalhadores, apesar do crescimento nos últimos anos.

“Atuar com aplicativo passa a ser uma solução rápida para garantir uma renda e pagar as contas. Uma maneira de subsistência”, explicou.

Leandro Mazetto está há três anos nessa atividade depois de perder o emprego de vigilante de carro-forte. O fato de não ter conseguido outra vaga com carteira registrada e um certo ganho na qualidade de vida contribuíram para continuar como motorista de aplicativo. “Trabalho dez, doze horas por dia, mas consigo interagir mais com a família. Consigo intercalar e levar e buscar o filho na escola. Para mim, não está tão ruim”, revelou. No entanto, Leandro Mazetto admite que ganhava mais como vigilante e não tem planos de continuar muito tempo a mais na atual função. “Vou ficar mais uns seis meses e abrir um negócio próprio na área de alimentação, uma pizzaria ou lanchonete.”

Marcos Donizeti Souza Matos trabalha há três meses com aplicativo, depois de ser motorista de ônibus por nove anos, e ainda não está convencido que a atividade é viável para ele. “Vou testar mais uns três meses para ver se volto a ser CLT ou não. Estou nessa porque tenho que viver.”

Uma pesquisa realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) revelou que os motoristas de aplicativo trabalham de 8 a 12 horas por dia e têm, em média, um rendimento de R$ 2,45 mil por mês, descontando todas as despesas. No caso dos condutores com nível superior completo, o rendimento dos plataformizados chegava a R$ 4,31 mil, mas essa parcela era minoritária entre os motoristas, com participação de 38,7% do total.

“Essa situação ocorre, entre outros motivos, pela falta de oportunidades de emprego que melhor se adequem às suas habilidades”, afirmou o analista do IBGE Gustavo Geaquinto. A divulgação do trabalho foi feita por esse órgão há pouco mais de um ano, em outubro de 2023, com o levantamento realizado por meio de uma cooperação técnica entre a Unicamp e o Ministério Público do Trabalho (MPT), com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).

TEMPORÁRIO

Vitor Oliveira Barbosa trocou há quatro meses a função de barbeiro pela de motorista de aplicativo. Ele trabalha normalmente das 5h às 13h, de segunda a sábado e disse ter hoje uma renda melhor.

“Trabalho com meta e somente paro após atingir R$ 300 no dia. Descontando R$ 100 por dia de etanol, dá para tirar bruto uns R$ 5 mil, R$ 5,5 mil por mês”, afirmou. Apesar disso, ele não vê a função de condutor como definitiva. “Não quero isso para o resto da minha vida. O desgaste do carro e o emocional são muito grandes”, explicou. Vitor Barbosa pretende fazer faculdade de Veterinária ou de Educação Física para atuar em uma dessas áreas.

De acordo com o economista Fábio Bentes, o aumento do número de motoristas cadastrados em aplicativos oculta os riscos para a Previdência Social no futuro. “É uma bomba de efeito retardado. No médio a longo prazo, isso é preocupante, já que tem um grande número de pessoas que não terão contribuído com a Previdência Social”, avaliou.

O perigo do crescimento da informalidade encontra respaldo na pesquisa divulgada pelo IBGE. Segundo o levantamento, apenas 22,3% dos condutores contribuíam para a Previdência, seja como autônomo ou microempreendedor individual (MEI). “É responsabilidade do Estado trazer todos para a realidade, por meio de campanhas, com sensibilização. Também deveria ser uma responsabilidade da própria empresa que emprega esses trabalhadores informais”, ressaltou o economista.

A atribuição, porém, de se resguardar é do próprio trabalhador. “As relações de trabalho estão mudando, e esses trabalhadores precisam de salvaguardas e pensar por eles mesmos”, recomendou Fábio Bentes. Para atuarem com aplicativo, os motoristas precisam ter na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) a inscrição de Exercício de Atividade Remunerada (EAR). 

MULTA

O motorista profissional flagrado sem a inclusão dessa anotação comete uma infração gravíssima, punida com multa no valor de R$ 293,47. Além disso, fica sujeito a sete pontos na CNH e pode ter o veículo apreendido. A inscrição de EAR é uma exigência feita por todas as empresas de aplicativo ao fazer um novo cadastro de interessado. A obrigatoriedade também é exigida pelas companhias de seguro de veículos.

Os motoristas relataram alto grau de dependência das plataformas. Segundo eles, os aplicativos respondem por cerca de 88% dos atendimentos feitos diariamente. De acordo com o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), há 1,72 milhão de pessoas trabalhando como motorista de aplicativo, aumento de 35% em comparação ao 1,27 milhão de 2023. Outros 455.621 condutores atuam como entregadores, com o total de trabalhadores vinculados às plataformas chegando a 2,2 milhões de pessoas. Segundo a pesquisa Mobilidade Urbana e Logística de Entregas do órgão, a renda bruta média por hora foi de R$ 47 no ano passado, com aumento real médio (acima da inflação) de 5% em relação ao período entre 2021 e 2022.

O levantamento mostrou que a idade média dos motoristas é 41 anos, enquanto a dos entregadores é 34. A maioria é composta de homens (98% dos entregadores e 94% dos motoristas), tem ensino médio completo (66% dos motoristas e 63% dos entregadores) e se declara preto ou pardo (66% dos entregadores e 64% dos motoristas).

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