CIDADE EM TRANSFORMAÇÃO

Campinas experimenta novo ciclo de verticalização urbana

Apesar da baixa atividade econômica do país, mercado imobiliário local tem demonstrado vigor ao lançar empreendimentos imobiliários, principalmente em bairros de classes média e alta da cidade

Edimarcio A. Monteiro/ edimarcio.augusto@rac.com.br
11/08/2022 às 17:01.
Atualizado em 11/08/2022 às 17:01
Prédio em construção na região do Taquaral é exemplo do novo ciclo de verticalização urbana em curso em Campinas (Gustavo Tilio)

Prédio em construção na região do Taquaral é exemplo do novo ciclo de verticalização urbana em curso em Campinas (Gustavo Tilio)

Campinas vive um novo processo de verticalização, com edifícios residenciais sendo erguidos principalmente em bairros de classes média e alta, como Nova Campinas, Taquaral e Cambuí. O salto de 247,3% no lançamento de novos apartamentos é um dos indicadores dessa tendência. Em 2021, 4.580 unidades chegaram ao mercado, contra 1.852 no ano anterior, de acordo com indicadores da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc).

O balanço da entidade também mostra a força do mercado imobiliário local, enquanto outras grandes cidades paulistas tiveram crescimento menor ou até queda. No ano passado, Sorocaba registrou alta de 161,31%, enquanto Ribeirão Preto amargou redução de 82,4% e São José do Rio Preto uma queda de 9,63%, aponta o relatório da Abrainc.

Dados da Prefeitura mostram que o mercado de Campinas segue aquecido em 2022. De janeiro e julho, a Secretaria de Planejamento e Urbanismo aprovou 5.120 novos projetos de grande porte, que representam um Valor Geral de Venda (VGV) de R$ 3 bilhões. Desse total, são 4.860 unidades residenciais, verticais e horizontais, e 260 comerciais. Em 2021, foram aprovados 13.956 projetos - 13.257 unidades residenciais e 699 unidades para comércios e serviços -, que representaram um VGV de R$ 9,1 bilhões.

Uma construtora voltada a empreendimentos de alto padrão teve quatro novos projetos aprovados em Campinas no ano passado, que representam um investimento de R$ 450 milhões no período 2021/2022. O valor é cinco vezes maior do que em 2019, ano de lançamento de seu primeiro empreendimento na cidade. Dos projetos aprovados, a construtora lançou um no ano passado. Outro chegou ao mercado no início deste ano e mais dois serão lançados neste segundo semestre. Os apartamentos têm entre 89 e 397 metros quadrados, todos no Cambuí.

Para a secretária municipal de Planejamento e Urbanismo, Carolina Baracat Lazinho, vários fatores explicam a atração de novos investimentos na construção civil. Entre eles, a mudança na Lei de Uso e Ocupação do Solo, o que permitiu a construção de imóveis residenciais em áreas que antes eram apenas comerciais e aumento do potencial construtivo em determinadas regiões. Carolina aponta ainda a desburocratização na aprovação de projetos, o que reduziu o prazo na tramitação dos processos. "Campinas se tornou uma cidade mais amigável para se investir", afirma.

Mudança no cenário

A verticalização resulta na mudança do cenário urbano, com obras de novos prédios se destacando entre casas e outros edifícios. A dona de casa Elza Martins, moradora no Taquaral, está hoje "espremida" entre prédios. Ao lado de sua casa está sendo construído um empreendimento com três torres de 15 andares cada. Residente no mesmo local há 64 anos, ela viu a mudanças da região, onde as casas foram derrubadas para dar lugar a condomínios verticais. "Nós já nos acostumamos com o barulho das obras. O inconveniente é que vamos perder a privacidade", diz dona Elza, referindo-se aos futuros vizinhos do prédio ao lado, que terão visão aérea do quintal da casa.

A publicitária Ainah Correa, residente no Jardim São Rafael, também viveu essa situação há um ano e acredita que outros prédios que estão sendo erguidos na região trarão outros transtornos. "O trânsito da Avenida Nossa Senhora de Fátima vai ter problemas no futuro. As famílias que moravam nas casas antigas estão dando lugar a prédios onde moram centenas de pessoas", afirma, ao explicar o seu receio sobre o adensamento populacional.

A região das Mansões Santo Antônio/Fazenda Santa Cândida, que viveu um boom vertical nos anos 1990 e início de 2000, agora passa por um novo processo. Somente no quadrilátero formado pelas ruas Lauro Vanucci, Olga Di Giorgio Gerracci, Arquiteto José Augusto Silva e Armando Strazzacappa estão sendo erguidos cinco edifícios, que somam 477 novos apartamentos. Outro terreno está cercado e traz aviso de mais um empreendimento, mas os detalhes ainda não foram divulgados.

Investimentos

Enquanto muitas áreas econômicas registram queda ou crescimento tímido, o setor da construção civil na região de Campinas deverá fechar 2022 com expressiva alta de 5%, projeta o diretor regional do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP), Márcio Benvenutti. O principal segmento a puxar o desempenho é justamente é o de empreendimentos residenciais, responsável por 80% desse resultado.

Ele indica uma mudança no perfil dos investimentos nessa área nos últimos dois anos. "O boom se deve principalmente aos investimentos voltados para as classes média e alta. Nos últimos dois anos, eram muito mais investimentos sociais", afirma. Para o diretor do Sinduscon, a mudança no perfil dos empreendimentos é resultado da queda do poder aquisitivo da população e da alta dos juros, que encarem os financiamentos.

No último dia 3, a Selic, que é a taxa básica de juros, sofreu o 12º aumento consecutivo e chegou aos 13,75% ao ano, o maior patamar desde novembro de 2016, quando estava em 14%. Em março de 2021, quando foi iniciado o processo de alta, a Selic era de 2,75%. Segundo a Associação Nacional dos Executivos (Anefac), o aumento da taxa elevou em mais de 20% o valor dos financiamentos, inclusive os imobiliários. "O aumento das taxas de juros combinada com a crise financeira influencia o mercado de forma geral", alerta a consultora Arlene Gomes, especialista em gestão imobiliária.

Apesar da mudança no perfil do cliente em potencial, a secretária de Planejamento e Urbanismo de Campinas argumenta que os investimentos da Prefeitura em transporte também atraíram investimento os distritos de Campo Grande e Ouro Verde, considerados mais populares. "Também tivemos vários projetos aprovados para essas regiões", diz Carolina Baracat Lazinho.

Empregos

O bom desempenho da indústria da construção civil resulta na geração de empregos. Após cinco meses desempregado, o ajudante de obras Fábio Novaes Santos começou a trabalhar há quatro dias. "O crescimento no número de construções facilitou a encontrar uma nova vaga", comemora. Segundo o Sinduscon, o setor emprega atualmente na região 30 mil trabalhadores com carteira assinada. De acordo com o diretor do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção, Montagem e Mobiliário de Campinas e Região (Sinticom), Juscelino Souza de Novaes Júnior, o número de vagas voltou ao mesmo nível de 2019, último ano antes da pandemia de covid-19.

"Está melhor do que no ano passado, mas ainda não voltou ao mesmo patamar de 2010 a 2014", afirma. Há oito anos, aponta o sindicalista, o segmento empregava 50 mil pessoas. Ou seja, de cada cinco postos de trabalho em 2014, dois foram fechados. Isso reflete nos salários da categoria. "Nós estamos conseguindo repor as perdas salariais, mas não aumento real", afirma Novaes Júnior.

Perfil dos imóveis

Os novos empreendimentos imobiliários têm um preço de venda entre R$ 8 mil e R$ 13 mil o metro quadrado e se sofisticaram para atrair os clientes. Eles seguem o conceito de condomínio clube e oferecem equipamentos como piscina, quadras de esporte, salão de festa, academia de ginástica e até área goumert.

Foi o que atraiu a professora Renata Silveira e a levou a trocar uma casa na Vila Costa e Silva por um apartamento no Jardim Belo Horizonte. "Tem tudo o que eu quero e está perto do que eu preciso", explica. Ela diz que sai de casa fora do horário pico e não sente possíveis problemas de congestionamento na região. "É bem tranquilo", completa.

Para Márcio Benvenutti, os clientes hoje buscam imóveis novos e mais completos, com os usados perdendo interesse. De acordo com ele, no primeiro semestre deste ano, houve alta de 11% na procura por imóveis novos de alto padrão e queda de 30% por imóveis usados. "Há uma preferência dos investidores comprarem imóveis novos financiados a longo prazo", afirma o diretor regional do Sinduscon. 

Apesar do bom resultado registrado este ano, ele considera que o desempenho para o próximo ano é uma incógnita diante de um cenário marcado pela alta dos juros, guerra da Ucrânia e Rússia, altas dos preços do petróleo e materiais de construção. "Falar em construção civil para 2023 é quase impossível", justifica Benvenutti. Segundo ele, a tendência dos negócios continuarem em alta depende de queda nos juros e de os imóveis novos continuarem a ser financiados a longo prazo.

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