DE OLHO NO CLIMA

Ar seco provoca 43 alertas da Defesa Civil em três meses

No entanto, uma frente fria prevista para hoje deve aliviar a situação atmosférica

Luiz Felipe Leite/uiz.leite@rac.com.br
09/08/2024 às 10:18.
Atualizado em 09/08/2024 às 10:50
Painel eletrônico instalado no Cambuí informa a população sobre estado de atenção em relação à baixa umidade do ar (Alessandro Torres)

Painel eletrônico instalado no Cambuí informa a população sobre estado de atenção em relação à baixa umidade do ar (Alessandro Torres)

A Defesa Civil de Campinas divulgou 43 boletins com alertas de Estado de Atenção e de Alerta para a Umidade Relativa do Ar (URA) entre o início de maio deste ano e o dia de ontem, 8 de agosto. Esse número é equivalente ao total de avisos emitidos entre o começo de maio e o final de setembro de 2023. Os dados foram levantados a pedido do Correio Popular.

Somente em agosto deste ano, até o fechamento desta reportagem, foram registrados oito alertas de Estado de Atenção, que são emitidos quando a URA fica entre 21% e 30%. Já os Estado de Alerta ocorrem quando a Umidade Relativa do Ar está entre 12% e 20%. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece que o índice ideal para o bom funcionamento do organismo humano é entre 40% e 70%.

Segundo o Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a recorrência de baixas URAs se deve à persistente massa de ar seco sobre a região central do Brasil, também conhecida como "Bloqueio Atmosférico". Esse fenômeno impede que frentes frias, que poderiam trazer chuvas, avancem, ficando retidas na região do Rio Grande do Sul.

De acordo com a pesquisadora do Cepagri, Ana Ávila, o mês de agosto está mais seco do que o habitual, com uma baixa média de chuvas. "Se formos aprofundar a nossa análise, não choveu o esperado desde o começo do ano até agora. E o inverno, que já é uma estação seca, está com esses níveis críticos devido a essas massas de ar seco e persistentes", explicou.

FRENTE FRIA

Ainda segundo a especialista, uma frente fria de forte intensidade, acompanhada de uma massa de ar frio de origem polar, conseguiu superar o bloqueio e poderá mudar as temperaturas na região de Campinas. "Vamos sair de uma temperatura de 31˚C, 32˚C para máximas em torno de 20˚C. Será uma amplitude térmica muito robusta. É importante que a população esteja preparada, pois é uma mudança rápida que impactará bastante nas condições do tempo. Na sextafeira, as chances de chuva aumentam para 90%, com tempo nublado e temperatura mínima prevista de 14˚C e máxima de 24˚C."

A previsão para amanhã, dia 10, é de céu nublado e possibilidade de chuvas pela manhã, com o tempo firmando a partir da tarde e diminuição da nebulosidade. Com a entrada de ar frio de origem polar, a temperatura mínima deverá ficar em torno de 11˚C (ao amanhecer e à noite), e a máxima em torno de 20˚C. O domingo de Dia dos Pais deverá ser de tempo firme e céu parcialmente nublado, com temperaturas entre 8˚C e 24˚C.

CUIDADOS

De acordo com a Defesa Civil de Campinas, uma das consequências da sequência de baixas umidades relativas do ar são os incêndios, sejam eles espontâneos ou criminosos. Trata-se de um problema grave que já atingiu números preocupantes neste ano. Entre os dias 1º de janeiro e 20 de junho, foram registrados 255 focos de incêndio em Campinas, um aumento de 454,3% em relação ao mesmo período do ano passado, quando houve 46 ocorrências. Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Na avaliação do coordenador regional e diretor da Defesa Civil de Campinas, Sidnei Furtado, a situação demanda uma conscientização constante por parte da sociedade. "Os possíveis incêndios preocupam, pois as pessoas, infelizmente, acabam ateando fogo. Isso pode se propagar para várias áreas, causando um risco incalculável. Tradicionalmente, o mês de agosto é mais seco, mas estamos na expectativa dessa nova frente fria, que vai aliviar muito a estiagem", pontuou.

Furtado também destacou outro impacto causado pela sequência de baixos níveis de URA: a saúde pública. A alternância entre temperaturas baixas e altas afeta especialmente crianças e idosos, que são mais vulneráveis. "São pessoas com um grau mais elevado de vulnerabilidade, por isso costumam ser as mais impactadas no aspecto de saúde", explicou.

RISCOS

Os cuidados com a saúde da população devem ser intensificados durante períodos de estiagem severa e quando há alterações bruscas nas temperaturas. É o que defende o médico Rafael Ceregatti, especialista em geriatria no Hospital São Francisco de Mogi Guaçu. Ele destaca que portadores de doenças respiratórias crônicas, como asma, bronquite e rinite, são os mais afetados pelas mudanças nos termômetros. "É comum que essas pessoas entrem em crise, mesmo que suas doenças estejam bem controladas. Outro problema são as doenças cardiovasculares. Quando a temperatura cai repentinamente, é comum a vasoconstrição elevar a pressão arterial, podendo causar crises hipertensivas e doenças relacionadas, como infartos e acidentes vasculares cerebrais (AVCs)", avaliou.

Ceregatti também enfatizou a importância de manterse bem hidratado e alimentado, especialmente no frio, quando o corpo necessita de um aporte calórico maior para produzir calor. Ele alertou sobre os riscos de choques térmicos, como tomar banhos quentes e sair imediatamente para ambientes frios, e o uso de aquecedores, que podem causar contrastes bruscos de temperatura. "Para os idosos, os riscos são os mesmos, mas eles são uma parte mais sensível da população e, portanto, mais suscetíveis. Atenção especial deve ser dada aos idosos e também às crianças", recomendou.

AÇÕES

João Victor Cunha, que trabalha há seis anos como vendedor de sucos em frente à entrada principal da Lagoa do Taquaral, comentou que costuma vender mais durante períodos de estiagem prolongada. No entanto, ele precisa se cuidar para evitar os efeitos do calor e das altas temperaturas. "Aqui, me mantenho hidratado e uso um ventilador na banca. Além disso, pratico atividades físicas fora dos horários de pico do sol. Mas quando as temperaturas caem bruscamente, sai de baixo (risos). Tomo muito cuidado, mas volta e meia acabo ficando resfriado", detalhou.

Aos 87 anos, Marly Apparecida Luporini Pallaro prefere passear com amigas em locais fechados, como shoppings da cidade. Moradora do Parque Prado, ela foi encontrada pela reportagem ao lado de sua cuidadora, Íris Maria Moreira de Lima, em um banco situado dentro de um parque de Campinas. Com bom humor, Marly destacou a importância de "uma boa sombra". "Não posso me descuidar, seja no sol com temperatura alta ou quando ela cai. Tenho rinite, então sempre acabo me prejudicando um pouco. É suportar, não tem jeito", relatou.

Leandro Gomes da Silva, que trabalha como divulgador de lojas na Rua 13 de Maio, no Centro de Campinas, se prepara da melhor forma possível para ficar confortável durante o expediente. "Uso boné, tomo água constantemente e tento ficar nos pontos de sombra do Centro. Mas nem sempre é possível. E essas mudanças bruscas na temperatura sempre nos complicam. Não tem jeito", concluiu.

UMIDADE

O Cepagri da Unicamp define a Umidade Relativa do Ar (URA) como a quantidade de vapor d'água presente na atmosfera em relação ao total máximo que poderia existir, considerando a temperatura observada. A umidade do ar tende a ser mais baixa principalmente no final do inverno e início da primavera, especialmente no período da tarde, entre 12h e 16h. A elevação da umidade ocorre sempre que chove, devido à evaporação subsequente, ou em áreas com florestas ou próximas a rios e represas, quando a temperatura diminui.

Existem várias orientações recomendadas para a população quando os índices de URA atingem os estados de Atenção, Alerta e Emergência. Segundo a Defesa Civil de Campinas, no Estado de Atenção, quando o índice fica abaixo de 30%, é recomendado evitar exercícios físicos ao ar livre entre 11h e 15h, umidificar o ambiente com vaporizadores, toalhas molhadas, recipientes com água ou molhando jardins, permanecer em locais protegidos do sol, preferencialmente em áreas com vegetação, e consumir água à vontade.

No Estado de Alerta, além das recomendações do Estado de Atenção, é necessário evitar aglomerações em ambientes fechados e usar soro fisiológico para olhos e narinas.

Quando a URA fica abaixo de 12%, no Estado de Emergência, é crucial seguir as recomendações dos estados de Atenção e Alerta e adotar medidas mais rígidas, como determinar a suspensão de atividades que exijam aglomerações de pessoas em recintos fechados, como cinemas e escolas, entre 10h e 16h, e manter os ambientes internos umidificados, especialmente quartos de crianças e quartos em hospitais. Essas medidas são essenciais para minimizar os impactos negativos da baixa umidade do ar na saúde e no bem-estar da população.

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