CULTURA

A memória de Campinas bem guardada

Centro de preservação da história da cidade, CCLA completou ontem 119 anos de existência

Francisco Lima Neto
cidades@rac.com.br
01/11/2020 às 10:19.
Atualizado em 27/03/2022 às 18:26
A biblioteca do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas tem um dos acervos mais importantes do País (à esq. e acima), e o espaço também resgata a memória de Carlos Gomes, inclusive com a presença do piano do artista, doado pelo governo do Pará em 1927 (Cedoc/RAC)

A biblioteca do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas tem um dos acervos mais importantes do País (à esq. e acima), e o espaço também resgata a memória de Carlos Gomes, inclusive com a presença do piano do artista, doado pelo governo do Pará em 1927 (Cedoc/RAC)

O Centro de Ciências, Letras e Artes (CCLA) completou 119 anos ontem. Trata-se de um dos grandes centros de preservação da história da cidade e um dos principais pontos de fomento da cultura e de resgate da biografia dos personagens mais relevantes da história do Município. O CCLA foi idealizado por César Bierrembach, que dava aulas de história da civilização no Colégio Culto à Ciência. Ele conseguiu reunir os educadores, cientistas e artistas mais renomados da cidade em torno do projeto. Assim, em 31 de outubro de 1901, nascia o CCLA. A primeira manifestação de sua história foi uma mensagem escrita por Maximiliano Coelho Neto para Santos Dumont, com os cumprimentos pelo seu voo ao redor da Torre Eiffel, já que seu feito marcava uma nova era da navegação aérea. Já no ano seguinte, 1902, o órgão passou a publicar uma revista cultural trimestral. A revista foi custeada por seu então presidente José de Campos Novais e já tratava de temas que no século atual continuam sendo importantíssimos: a preservação das matas e defesa da cultura indígena.   Sete anos após sua fundação, a sede própria já era inaugurada na Rua Conceição, esquina com a então Rua Francisco Glicério. Ali se desenvolveu intensa atividade cultural, com nomes de grande expressão, como o escritor e jurista Ruy Barbosa e a pianista Guiomar Novaes, e muitos outros. Infelizmente, em 1936, o prédio precisou ser demolido por conta do plano urbanístico de Prestes Maia, de alargamento de ruas e avenidas. Após a demolição, as diretorias seguintes se dedicaram para conseguir adquirir novo terreno, na Avenida Francisco Glicério esquina com a Rua Bernardino de Campos. A inauguração ocorreu em 1942, com palestra do embaixador Macedo Soares na presidência de Nelson Omegna. Contudo, durante uma década, as diretorias seguintes sofreram com dificuldades financeiras provenientes da construção da sede, o que causou diminuição das atividades. De acordo com informações do CCLA, as atividades culturais foram retomadas a partir de 1953, bem como foi instalado o Departamento de Cinema do CCLA. Entre as décadas de 1970 e 1980, o Centro sediou o primeiro festival de filmes Super 8mm em nível nacional. O festival foi realizado por dez anos seguidos, período em que a instituição enfrentou dificuldades com a censura política instaurada pela ditadura militar de 1964. Entre os organizadores do festival estava Henrique de Oliveira Junior, referência em cinema na cidade e região, e que recentemente completou 100 anos de vida. De acordo com o órgão, a primeira exposição futurista no Brasil, de Lasar Segall, fora de São Paulo, aconteceu no CCLA, onde permanece uma das obras de Segall, doada pelo pintor na ocasião. Em 1961, nas comemorações dos 60 anos, a instituição promoveu uma série de palestras representativas do “Panorama da Cultura no Brasil”. Alguns dos principais nomes da cultura brasileira na época participaram, como Antônio Cândido, Júlio de Mesquita Filho, Florestan Fernandes, Dami Souza Santos, Mario Schenberg e o professor Pietro Maria Bardi, que expôs desenhos originais de Lasar Segall. Uma comprovação da importância e respeito alcançados pelo órgão ao longo de sua trajetória. Entre outros, foram presidentes do CCLA: Bráulio Mendes Nogueira, Elisiário P.Palermo, Rodolfo Bueno, Herculano Gouveia, Francisco Isolino de Siqueira, Álvaro Cotomacci e Marino Zigiatti, que desde 1950 sempre esteve envolvido com o CCLA. Entre 1994 e 1997 o Centro teve a primeira mulher presidente, a professora Dayz Peixoto. O presidente atual é Alcides Ladislau Acosta. O CCLA tem uma biblioteca que conta, atualmente, com 150 mil volumes, uma Pinacoteca e dois museus, dedicados ao Maestro Carlos Gomes e a Campos Sales. Conta também com galeria de arte, sala de leitura, vitrine cultural e auditório para 220 pessoas. O auditório já cedeu seu palco para espetáculos como o Monólogo de Procópio Ferreira, entre outros de repercussão nacional e internacional. A biblioteca A biblioteca passou a ser constituída desde a fundação do CCLA e hoje tem um dos acervos mais importantes do País. A maior parte das obras é considerada rara ou preciosa. Algumas datam de 1500. O acervo conta com coleções de revistas e jornais de Campinas do século 19, entre eles, a Gazeta de Campinas de 1870 e o Diário de Campinas de 1875, além de outras que são fonte de pesquisa. Dentre os variados assuntos, a biblioteca abrange História, enciclopédias, dicionários, obras das diversas áreas, como medicina, religião, monografias, história da cidade e um rico acervo de literatura com várias preciosidades em suas primeiras edições. Os livros de autores campineiros são mantidos num espaço reservado, formando a coletânea campineira. A Pinacoteca O acervo da Pinacoteca é formado por 180 obras de arte, incluindo telas de artistas cujos estilos vão do Romantismo e do Neo Classicismo ao Impressionismo, representando a mais expressiva coleção de obras de arte de Campinas. São telas assinadas por artistas de renome, tais como: Benecdito Calixto, Almeida Júnior, Lasar Segall, Bruno Giorgi, entre outros. A Pinacoteca foi formada por doações realizadas desde as primeiras décadas do século XX e teve início com retratos de seus fundadores pintados por artistas famosos, como Fernando Piendereck e Salvador Caruso. Iniciativa de César Bierrembach dá origem ao Arquivo Carlos Gomes Em 1904, César Bierrembach teve a iniciativa de começar a reunir itens essenciais para a preservação da memória de Carlos Gomes, de quem era amigo. Foi a origem do Arquivo Carlos Gomes, composto ainda por objetos pessoais do pai, Manuel José Gomes, e do irmão, José Pedro Sant’Anna Gomes, do maestro e compositor, maior nome da história cultural de Campinas e um ícone brasileiro. Em 1927, o CCLA recebeu do governo do Pará o piano de Carlos Gomes, que também integra o acervo do Museu. Também estão lá as partituras originais de suas grandes obras, como O Guarani”, O Escravo e Maria Tudor. O museu foi oficializado em 1956, com apoio e grande participação do historiador José de Castro Mendes. Já em 1906, Manuel Ferraz de Campos Salles, logo que deixou a Presidência da República, visitou o CCLA e doou valiosos documentos e objetos de sua propriedade. Esses documentos, acrescidos de vasta bibliografia, compõem o acervo do Museu Campos Salles. Nascido em Campinas, a 15 de fevereiro de 1841, teve longa carreira política. Foi eleito senador em 1891 e, em 1896, presidente de São Paulo. Chegou à presidência da República em 1898, permanecendo até 15 de novembro de 1902. Entre os objetos que integram o acervo do Museu Campos Salles está o álbum de fotografias da Comissão de Limites entre o Brasil e a Bolívia, de 1901, com iniciais do presidente (“C.S”) na capa. O CCLA conta ainda com núcleos de Artes Plásticas e Visuais, Ciências, Cinema, Ecologia, História, Literatura, Música, Raízes Culturais e Teatro.

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