Mário dos Santos Sampaio foi morto dentro de um restaurante na Enseada, no Guarujá (Reprodução de vídeo )
Um áudio gravado pelo Comando de Operações da Polícia Militar (Copom) revela o último diálogo do estudante de Campinas Mário Sampaio, de 22 anos, minutos antes de morrer dentro de um restaurante, no Guarujá, na véspera de Ano Novo. O Correio teve acesso ao conteúdo da ligação feita pelo universitário, solicitando ajuda policial, após ser ameaçado por funcionários e pelo dono do restaurante Casa Grande, na Praia da Enseada. Em 2 minutos e 51 segundos de conversa, o atendimento feito pelo número de emergência não foi finalizado.
Durante todo o diálogo, a atendente do Copom não deu sinais de que enviaria uma viatura, apenas que teria registrado o endereço do local da ocorrência no sistema, mesmo com a vítima tendo repetido cinco vezes que estava sob ameaça de uma faca. Além disso, não há uma orientação por parte da policial para que o jovem se afastasse do restaurante.
Na gravação, é possível identificar que o diálogo de Mário com a atendente foi interrompida aos 2 minutos e 50 segundos, quando uma pessoa, que seria José Adão Pereira Passos (dono do restaurante, acusado de golpear três vezes a vítima), se aproxima gritando e falando palavrões. Em seguida, é possível ouvir discussão e a ligação é interrompida. Segundo depoimentos das testemunhas, nessa hora, Adão teria dado um tapa na cara do estudante, que derrubou o celular no chão, o que teria provocado o fim do telefonema.
O caso
Mário e cinco amigos iam passar a virada do ano na cidade do Litoral e, antes da meia-noite, resolveram jantar no restaurante de Adão. De acordo com os amigos, eles entraram no estabelecimento após verem placas que informavam o valor de R$ 12,99 pela refeição. Porém, na hora de pagar a conta, o restaurante quis cobrar R$ 19,99, uma diferença de R$ 7,00. Mário não achou justo e foi reclamar com o gerente do local e filho de Adão, Diego Souza Passos. Uma discussão foi iniciada. Além de Diego, um garçom entrou em luta com a vítima. Adão se aproximou com a faca e feriu três vezes o estudante, que caiu e morreu no local.
No começo deste mês, a Justiça do Guarujá decretou a prisão preventiva dos três acusados pela morte do estudante. Além de José Adão, que está preso junto com o filho, Diego, o garçom do estabelecimento Robson de Jesus Lima também foi indiciado pelo assassinato do jovem. O garçom está foragido. Nas gravações, Mário fala várias vezes que Robson está com uma faca na mão, fazendo ameaças.
Áudio
O áudio foi entregue à Polícia Civil em janeiro e até então era mantido em sigilo. A divulgação partiu de fontes não ligadas à polícia. O tempo da conversa é classificado por especialistas como grande. Eles disseram que, em casos onde há ameaça iminente, a ação deve ser rápida. Policiais consultados pelo Correio afirmaram que o atendimento deve ser feito em, no máximo, dois minutos e que o encaminhamento para a viatura com aviso para a vítima deve ser feito o mais breve possível.
A constatação da demora também foi reforçada pelas testemunhas que estavam no interior do restaurante. Elas disseram que o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), chamado após Mário ter sido ferido, chegou antes da PM. “Não sei precisar quanto tempo levou, mas demorou para a PM chegar e o Samu chegou antes. Mário foi ferido, caiu no chão, fiquei falando com ele e nada da polícia. Até uma pessoa me deu um copo com água. A PM chegou porque uns amigos foram até a rua chamar uma viatura e não por causa do telefonema”, afirmou a namorada da vítima, Patrícia Bonani. “A atendente ficou repetindo e perguntando o local, mas era na Praia da Enseada, na Avenida D. Pedro, e ela queria o número. Ele falou até detalhes. Repetiu a pergunta do número várias vezes”, contou.
“A PM tem um padrão que tem que ser seguido. O que tem que ser investigado é o atendimento dessa chamada”, afirmou o conselheiro em segurança e coronel da reserva da PM José Vicente da Silva Filho.
De acordo com informações da Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP), a PM deve chegar no local da ocorrência em até oito minutos após a ligação, o que não ocorreu.
Nos primeiros segundos da conversa, Mário explica para a atendente do Copom que está no interior de um restaurante no Guarujá: “Estou em uma praia aqui na Enseada, em um restaurante, e tem vários garçons porque eles cobraram um preço, R$ 12,90, tá o restaurante inteiro aqui. Eles aumentaram o preço enquanto o pessoal comia. Agora tem um cara falando aqui que vai bater nos clientes. E tem um que pegou até faca aqui e está o maior tumulto. É na Praia da Enseada”.
“Pelo quadro da ligação, era uma situação de real emergência, pois havia ameaça. Não que uma viatura fosse chegar e evitar o assassinato. Mas, se tivesse uma viatura próxima do local, quem sabe?”, disse o especialista em segurança José Henrique Spécie. O Correio tentou contato nesta segunda (18) com o comando da PM no Litoral, mas não obteve resposta.