O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve nesta quarta-feira, 3, por 7 votos a 4, decisão que autorizou a cobrança retroativa de impostos não pagos no passado por força de sentença judicial definitiva - a chamada "quebra da coisa julgada". Os ministros analisaram recursos apresentados contra sentença proferida em fevereiro do ano passado pela qual decisões que autorizaram contribuintes a não pagar tributos perdem eficácia se a Corte se pronunciar, tempos depois, em sentido contrário.
Na prática, a decisão faz com que as empresas tenham de voltar a pagar impostos dos quais eram isentas, de forma retroativa, mesmo com sentenças favoráveis antes "transitadas em julgado" (quando não há mais recursos). Os ministros devem finalizar o julgamento nesta quinta, 4, já que faltou definir a possibilidade de cobrança das multas punitivas e moratórias decorrentes do não pagamento.
O tema gerou polêmica no meio jurídico - com forte divisão entre os próprios ministros do Supremo -, em meio a avaliações de que traz risco de insegurança jurídica ao País.
No caso concreto, que discutia a incidência da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), os ministros entenderam que a cobrança deve retroagir até 2007, data em que o Supremo considerou o tributo constitucional. Os contribuintes pleiteavam a modulação dos efeitos para não permitir que a decisão tivesse efeitos no passado. O impacto é milionário para as empresas envolvidas.
Os recursos foram apresentados pela Têxtil Bezerra de Menezes (TBM), que foi parte no processo; pelo conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp); e pelo Sindicato das Indústrias de Produtos Químicos (Sinpeq).
Votos
Para o relator do caso no Supremo, Luís Roberto Barroso, as empresas que não voltaram a pagar a CSLL após a decisão do Supremo fizeram uma "aposta". "A partir da publicação da ata da decisão de 2007, já não havia mais dúvida de que o tributo era devido", disse ele. Além de Barroso, Rosa Weber, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes também votaram para manter a decisão de fevereiro.
O ministro André Mendonça também entendeu que o tributo é devido desde 2007, mas defendeu a isenção das multas punitivas e moratórias decorrentes do não pagamento. "Não entendo como se pode entender existir conduta reprovável por parte do contribuinte que se socorreu no Judiciário", afirmou o ministro.
Os ministros Luiz Fux, Edson Fachin, Dias Toffoli e Kássio Nunes Marques votaram para acolher os pedidos e reformar a sentença. Para eles, a decisão só poderia ter efeitos a partir de fevereiro de 2023, quando o Supremo julgou o tema, e a Receita Federal não poderia cobrar tributos que não foram recolhidos no passado por força de decisão definitiva.
Na sessão de ontem, Toffoli afirmou que o caso é "um dos julgamentos mais importantes" dos quais participou em 14 anos como juiz constitucional. "Estamos aqui a adentrar no campo da coisa julgada, e coisa julgada de muitos e muitos anos, e permitindo abrir ações rescisórias inúmeras sendo que precisamos refletir sobre segurança jurídica e previsibilidade", afirmou. Já Fux defendeu que a modulação era necessária para preservar a segurança jurídica, visto que o cenário era de "incerteza para diversos players do mercado".
Decisão no ano passado tornou divergência sobre o tema pública
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que mudou o entendimento sobre cobrança de tributos de empresas desencadeou uma divergência pública entre os ministros no ano passado.
Dois dias após o julgamento, em 10 de fevereiro, o relator da ação, ministro Luís Roberto Barroso disse que as empresas fizeram uma "aposta no escuro" ao não provisionar recursos para pagar tributos questionados na Justiça. O ministro Luiz Fux, por outro lado, afirmou que a decisão "criou a maior surpresa fiscal" já vista no País e "um risco sistêmico absurdo", uma vez que as empresas não tinham como adivinhar a mudança de posição.
"Quem não se preparou, fez uma aposta no escuro, e aí a gente assume os riscos das decisões que toma", disse Barroso em vídeo divulgado pela Corte. "Quem tem coisa julgada, não provisiona", disse Fux ao Estadão na ocasião.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.