A Procuradoria-Geral de Justiça apura suspeita de conflito de interesse entre o secretário da Educação de São Paulo, Renato Feder, e a pasta que ele comanda. Feder é sócio de uma offshore dona de 28,16% das ações da Multilaser, empresa que mantém contratos de R$ 200 milhões com a sua pasta, o que motivou a investigação. Ao todo são três contratos para o fornecimento de 97 mil notebooks para a rede pública estadual.
A investigação foi aberta em março pela Promotoria da Cidadania pelo promotor André Pascoal. O caso foi repassado ao procurador-geral de Justiça, Mário Luiz Sarrubbo, a quem compete processar autoridades com foro privilegiado como secretários de Estado.
Conforme mostrou o Estadão, Feder está no centro de uma polêmica por descartar o uso de livros didáticos pelas escolas públicas de São Paulo. Ele abriu mão de 10 milhões de exemplares para os alunos do ensino fundamental 2 (6º ao 9º ano) no ano que vem para usar apenas material digital. O ensino médio também deixará de ter livros impressos. "A aula é uma grande TV, que passa os slides em Power Point, alunos com papel e caneta, anotando e fazendo exercícios", justificou.
Feder é acionista da Dragon Gem LLC, com sede no estado americano de Delaware, conhecido paraíso fiscal. Os contratos de sua pasta com a Multilaser foram assinados em dezembro de 2022 pela secretaria, após a eleição de Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao governo de São Paulo, mas antes de ele tomar posse como secretário. O último contrato, de R$ 76 milhões, foi assinado no dia 21 de dezembro de 2022, quando ele já havia sido anunciado para o cargo. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) também passa um pente fino nos contratos.
Além da apuração do Ministério Público, Feder é cobrado a prestar esclarecimentos à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), o que ele tem ignorado sistematicamente. Pela terceira vez a presidência da Casa enviou ofício ao secretário para que o secretário responda o requerimento de informações 79/2023, feito em março, pelo deputado estadual Guilherme Cortez (PSOL). No dia 10 de maio, a assessoria do presidente da Alesp, deputado André do Prado (PL), enviou o primeiro ofício solicitando uma explicação de Feder sobre os contratos. Seguiram-se outros dois, nos dias 14 de junho e 31 de julho e, até agora, segundo a Alesp, o secretário não prestou as informações.
Nesta semana, outra investigação foi aberta pelo Ministério Público Estadual tendo o secretário como alvo, conforme revelou o Estadão. Trata-se de um inquérito civil para verificar a decisão do governo Tarcísio de dispensar livros didáticos nas escolas estaduais para usar apenas material digital. A promotoria estipulou prazo de dez dias para a secretaria mostrar as "justificativas pedagógicas e financeiras" para recusar as obras do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), em que o Ministério da Educação compra e distribui gratuitamente aos colégios públicos de todo País.
A estratégia do governo de São Paulo atualmente é a de aulas organizadas em Power Point, com cerca de 20 slides, que são passados pelo professor em sala de aula. "Não é um livro didático digital. É um material mais assertivo, com figuras, jogos, imagens 3D, exercícios. Ele pode clicar em links, abrir vídeos, navegar por um museu", explicou o secretário em entrevista. Feder também justificou a decisão por considerar os livros do PNLD "superficiais".
Segundo o pedido da promotora Fernanda Peixoto Cassiano, a "adoção de material didático exclusivamente digital dificulta o acesso de alunos sem suporte de equipamentos tecnológicos" nas escolas e em casa, o que coloca em risco a obrigação constitucional e legal do Estado de fornecer material didático. A decisão de Feder pode "configurar tratamento desigual entre os estudantes".
COM A PALAVRA
O Estadão procurou a assessoria do secretário. Perguntou se ele já havia se manifestado nas apurações do MPE e se já havia respondido ao requerimento da Assembleia. E, se fosse o caso, qual seria o conteúdo das manifestações. O secretário respondeu por meio de sua assessoria, que enviou esclarecimentos ao Ministério Público (veja a íntegra abaixo). Na resposta, ele afirmou que o Estatuto do Funcionalismo Público de São Paulo não veda que funcionário sejam acionista de empresas que mantenham contrato com o Estado.
Também informou à Procuradoria-Geral que as aquisições feita pela Pasta nos contratos com a Multilaser obedeceram a critérios técnicos e foram referendadas pela assessoria técnico-jurídica da secretaria. Por fim, Feder afirmou que assumia compromisso com a procuradoria de não realizar novos contratos da pasta com a Multilaser enquanto dirigir a secretaria.
De acordo coma resposta enviada por Feder ao Ministério público, o Estatuto do Funcionalismo Público de São Paulo não veda que funcionários sejam acionista de empresas que mantenham contrato com o Estado, o que seria o seu caso. Ele também informou à Procuradoria-Geral que as aquisições feita pela Pasta nos contratos com a Multilaser obedeceram a critérios técnicos e foram referendadas pela assessoria técnico-jurídica da secretaria. Por fim, Feder afirmou que assumia compromisso com a procuradoria de não realizar novos contratos da pasta com a Multilaser enquanto dirigir a secretaria.