A relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), pediu o indiciamento de 61 pessoas, entre civis e militares, no relatório final do colegiado. Ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Eliziane atribui os crimes de associação criminosa, tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito, tentativa de depor governo legitimamente constituído e emprego de medidas para impedir o livre exercício de direitos políticos.
Isso não significa que Bolsonaro e os outros serão processados imediatamente. A listagem apresentada na sessão de ontem da CPMI é uma sugestão apresentada pela relatora, com base em investigações e depoimentos tomados pelos parlamentares. Caso o relatório seja aprovado nesta quarta-feira, 18, o documento será enviado a outros órgãos, como a Procuradoria-Geral da República, responsáveis pela apuração das responsabilidades. Caberá a eles analisar a possível apresentação de denúncia à Justiça.
A decisão, assim, passará pelo escolhido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o cargo de procurador-geral da República. Será dele a opção de processar ou não as pessoas apontadas pela CPMI, ou de deixar a comissão "acabar em pizza", sem que ninguém tenha de enfrentar a Justiça. O mandato de Augusto Aras na PGR se encerrou no mês passado. Elizeta Maria de Paiva Ramos exerce a função de forma interina. Lula, que tem adiado a indicação, disse que deverá pôr na cadeira "um amigo do País", "que não faça denúncia falsa".
A votação do relatório de Eliziane está prevista para ocorrer hoje, e tanto oposição quanto situação estimam que será aprovado com 20 votos favoráveis e 11 contrários.
'Autor intelectual'
Bolsonaro é considerado pela relatora como o autor intelectual dos ataques aos prédios dos três Poderes, como antecipou a Coluna do Estadão. Eliziane disse que o ex-presidente "nunca nutriu simpatia por princípios republicanos e democráticos" e queria se manter no poder de forma autoritária. "O então presidente tem responsabilidade direta como mentor moral por grande parte dos ataques perpetrados a todas as figuras republicanas que o impuseram qualquer tipo de empecilho a sua empreitada golpista", afirmou.
Outros nomes do "núcleo duro" do governo Bolsonaro, como os generais Braga Netto e Augusto Heleno, estão na lista. Em 1.333 páginas, o relatório sugere indiciamentos por 26 tipos de delitos. Nele estão incluídos apontamentos sobre a emissão fraudulenta de cartões de vacinação em nome da família Bolsonaro e sobre a tentativa de venda de joias e outros bens do patrimônio da Presidência.
Eliziane escreveu que Bolsonaro agiu em conluio com Mauro César Barbosa Cid, Mauro Cesar Lourena Cid, Frederick Wassef, Osmar Crivelatti, Marcelo Costa Câmara e Marcelo da Silva Vieira "para apropriação de bens de alto valor recebidos em razão da função, por agentes públicos em viagens internacionais a serviço da República Federativa do Brasil".
Nesses casos, a relatora ponderou que, apesar de a CPMI ter encontrado elementos de autoria, os temas não estavam no foco da comissão. Por isso, recomendou que órgãos competentes continuem a apurar. Não há pedidos de indiciamento baseados nesses eventos.
Paralelo
Congressistas de oposição se articularam para apresentar um relatório paralelo. O texto foi protocolado por 16 parlamentares e lido em resumo ao fim da sessão.
Os autores pedem que Lula e o ministro da Justiça, Flávio Dino, sejam indiciados junto com o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Gonçalves Dias, o ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência Saulo Moura Cunha e dois membros da cúpula da Polícia Militar do Distrito Federal. A oposição acusa Lula de omissão, alegando que ele viajou ao interior de São Paulo nas vésperas dos atos antidemocráticos, mesmo sabendo do risco de violência.
Além do parecer da oposição, outro relatório alternativo foi apresentado. Elaborado pelo senador Izalci Lucas (PSDB-DF), o documento atribui a culpa pelos atos golpistas a Dino e Gonçalves Dias, e também pede a suspeição e impedimento da relatora da CPMI.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.