A posse do ministro Alexandre de Moraes como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nesta terça-feira, 16, vai juntar numa mesma sala desafetos políticos que publicamente trocam insultos e acusações. Adversários ferrenhos, estarão lado a lado o petista que lidera a corrida eleitoral Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), que com ele polariza a disputa; os ex-presidentes Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT), no primeiro encontro público pós-impeachment.
A ida de Bolsonaro foi confirmada nesta terça-feira, 16, pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira. Moraes foi pessoalmente ao Palácio do Planalto entregar o convite ao atual presidente, que teria recebido a mensagem em clima amistoso. Lula já avisou que não faltará. Por conta de regras do cerimonial, Temer e Dilma, além de estarem pela primeira vez juntos num evento oficial, deverão sentar-se um do lado do outro no plenário do TSE.
Segundo afirmou uma servidora da área de preparativos do tribunal, os ex-presidentes ficam "ilhados" num mesmo lugar do plenário, e a organização dos assentos é feita por ordem de antiguidade no cargo. Assim, Dilma terá que sentar próxima a Temer. Recentemente, o ex-presidente do MDB que foi vice na chapa de Dilma em 2014 declarou que ela era "honesta". Em resposta pública Dilma retrucou dizendo que Temer era golpista. Diante do novo ataque da petista, o medebista reagiu com ironia: disse que não vai mais chamá-la de honesta.
Caso Bolsonaro compareça de fato ao evento, ele deverá ocupar uma cadeira na tribuna, ao lado do presidente da Corte. Há quatro anos, Temer se sentou ao lado do então presidente empossado, Luiz Fux. Na cerimônia deste ano, Bolsonaro ficaria à direita do novo presidente Moraes, que é o alvo preferencial de seus ataques. Essa disposição de assentos também fará com que o atual presidente passe toda a cerimônia posicionado em frente a Lula. Bolsonaro tem chamado o adversário petista de ladrão, petralha, nove dedos, "bêbado que quer dirigir o País" e o responsabiliza pelos casos de corrupção investigados na gestão petista. Já Lula fez discurso chamando Bolsonaro de "coisa grotesca", de não gostar de democracia, mulheres, negros e LGBTs.
A reunião com a presença dos dois principais candidatos à presidência, ambos cercados de seguranças, fez com que o TSE reforçasse o esquema de proteção e adotasse um protocolo de controle do acesso ao prédio ainda mais rígido do que o convencional. Além de Moraes, também tomará posse o vice-presidente Ricardo Lewandowski.
Para além do constrangimento público que adversários passarão ao participarem do mesmo evento, a solenidade no TSE ocorre num momento em que o Tribunal é alvo de ataques de Bolsonaro que insiste em, mesmo sem provas, colocar em dúvida o processo eleitoral. O TSE também enfrenta crise com o Ministério da Defesa em torno do procedimento de fiscalização das urnas eletrônicas.
Nova relação com militares
A assessores próximos, Moraes tem dito que não se preocupa com as investidas dos militares contra as urnas eletrônicas e que, apesar da retórica belicosa de alguns oficiais ligados ao governo, os generais da ativa estão comprometidos com a democracia.
A passagem de bastão do atual presidente do TSE, Edson Fachin, para Moraes é vista por atores de tribunais superiores como uma chance de distensionar a escalada de conflitos entre a Justiça Eleitoral e o alto comando militar. Fachin tem atuado com firmeza em relação aos questionamentos da caserna sobre o sistema eleitoral, como na decisão de expulsar o coronel Roberto Sant´Anna do grupo de trabalho das Forças Armadas que inspeciona os códigos-fonte das urnas, após identificar o compartilhamento de notícias falsas.
A expectativa de que o diálogo entre as instituições melhore se deve ao fato de Moraes transitar com mais facilidade entre os militares do que Fachin. O próximo presidente do TSE tem contato direto com os oficiais de alta patente. Moraes treina no Clube Militar de Brasília e tem dito a assessores que as conversas com o generalato já estão em curso e devem se intensificar a partir do momento em que assumir a presidência da Corte Eleitoral.
Segundo um servidor ligado ao gabinete de Moraes no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro já disse que não se preocupa com o modo como as Forças Armadas têm agido sob comando do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira. A mensagem do ministro a pessoas mais próximas é de que sua gestão vai intensificar o diálogo para não deixar que os questionamentos dos militares afetem o processo eleitoral.
Combate a fake news
Outra frente em que o próximo presidente do TSE pretende centrar esforços é no combate às fake news. Moraes já conta em seu gabinete com uma estrutura de monitoramento de grupos extremistas. Ele tem dito que o combate à desinformação durante a sua gestão será "rigoroso e rápido", a exemplo da decisão de julho deste ano, quando determinou a retirada de conteúdos das redes sociais que associavam o Partido dos Trabalhadores (PT) à facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
Antes mesmo de o seu mandato completar um mês, Moraes já terá lidado com as manifestações bolsonaristas do Sete de Setembro, quando o presidente Jair Bolsonaro (PL) promete reeditar os atos realizados na mesma data do ano passado. Na ocasião, o chefe do Executivo prometeu a seus apoiadores não mais cumprir qualquer decisão proferida por Moraes, a quem chamou de "canalha".
No feriado deste ano, quando será celebrado o bicentenário da Independência, Moraes garante que não serão toleradas ameaças contra as instituições e a democracia. A pessoas próximas, ele cita como exemplo da rigidez que terá no período a decretação da prisão do bolsonarista Ivan Rejane Fonte Boa Pinto, em julho, por ter dito que iria "caçar" integrantes do Supremo e lideranças de esquerda, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Moraes deu indicativos nos últimos meses de como será a sua gestão. Na última sessão do TSE sob o comando de Fachin, ele disse que o colega deixou a lição de que "democratas não devem se calar perante ofensas". "Os democratas não devem transigir em seus princípios. Os democratas não devem e não podem aceitar ataques covardes, sejam pessoais ou institucionais, que pretendam corroer as bases da nossa República", completou.