Filho do conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão - um dos suspeitos de mandar matar a vereadora carioca Marielle Franco em 2018 -, Kaio Brazão foi exonerado do gabinete onde era assessor parlamentar na Câmara Municipal desde janeiro de 2021. A publicação, com efeito retroativo, foi publicada no Diário Oficial desta terça-feira, 9, e libera Kaio da função pública a partir de 1º de abril.
A movimentação abre caminho para que o filho de Domingos e sobrinho do deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) possa concorrer ao cargo de vereador do Rio nas eleições de outubro. Pela regra, o prazo para desincompatibilização eleitoral, ou seja, intervalo para que ocupantes de cargos no serviço público se afastem da função para poderem se candidatar a um cargo eletivo, é de três meses antes do pleito. Procurado pelo Estadão, Kaio não comentou os planos políticos.
Kaio atuava como assessor parlamentar no gabinete do vereador Waldir Braza~o (sem partido) na Câmara do Rio. Apesar de usar o sobrenome da família, Waldir Rodrigues Moreira Junior não tem laços consanguíneos. Ele é ex-chefe de gabinete do deputado estadual Manoel Brazão (União-RJ), irmão mais velho de Domingos e Chiquinho. O conselheiro e o deputado federal estão presos desde 24 de março, e o parlamentar também responde a um processo de cassação do mandato na Câmara.
O Estadão procurou o vereador Waldir Braza~o e a assessoria dele no gabinete da Câmara Municipal, mas a informação é de que não havia ninguém para comentar o assunto.
Em agosto de 2023, Kaio foi lançado pré-candidato a vereador no Rio. Na ocasião, o prefeito da capital fluminense, Eduardo Paes (MDB), elogiou a família Brazão e disse que é ela quem "melhor representa Jacarepaguá", na zona oeste da capital.
Paes afirmou que "a tradição não pode parar", ao explicar que quem colocou "pilha" na pré-candidatura de Kaio foi o próprio prefeito. "Eu falei: vamos botar um moleque novo nessa história, para ter energia, disposição, acordar cedo e dormir tarde", disse se referindo ao filho de Domingos Brazão.
Em outubro do ano passado, o prefeito nomeou Chiquinho como secretário especial de Ação Comunitária na prefeitura, função que o deputado exerceu até fevereiro. Paes se manifestou no último dia 30, após a prisão dos dois suspeitos, dizendo que foi "um erro colocar no governo uma pessoa que tinha suspeita no caso" Marielle.
Nas redes sociais, Kaio menciona os planos de iniciar a carreira política. Em setembro do ano passado, disse "estar pronto para continuar fazendo a diferença para melhor na vida das pessoas". No post em conjunto com o tio e o pai, ele afirma que "encara o desafio com garra e paixão".
Kaio, que não é filho biológico de Domingos, ao qual se refere como seu pai nas redes sociais e convive desde os 3 anos, pediu na Justiça para ter o sobrenome do padrasto adicionado ao dele em 2022. A solicitação foi atendida em fevereiro deste ano. Um dos sobrenomes da mãe, "Kroff", é usado por Kaio como nome artístico para tocar músicas eletrônicas, o que faz como DJ amador.
Já na recém-iniciada vida política, ele usa o sobrenome do pai e do tio. O ex-assessor deve concorrer ao pleito de outubro pelo Republicanos, sigla ao qual é filiado desde junho de 2023. Procurada para comentar sobre os planos para Kaio, a legenda não respondeu. Antes, ele foi filiado ao União Brasil por um ano e meio. O pai, Domingos, já passou pelo PL, pelo PTB e pelo MDB, antes de ser conselheiro. O tio de Kaio, Chiquinho, passou pelo MDB, pelo Avante e pelo União Brasil - do qual foi expulso após ser preso preventivamente, suspeito de ser um dos mandantes do assassinato de Marielle.
O pai e o tio são políticos influentes e veteranos no Rio de Janeiro, com décadas de mandatos em casas legislativas. Antes de entrar para a política, eles eram donos de postos de combustíveis na cidade. Ambos se elegeram e se mantiveram em cargos públicos, principalmente com votos conquistados no reduto eleitoral da família, em bairros como Gardênia Azul e Rio das Pedras, na zona oeste da cidade.
No relatório final da CPI das Milícias, de 2008, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), os irmãos são citados como políticos influentes nessas regiões - influência que se estende a várias instâncias de poder no Estado. O nome do então deputado Domingos Brazão, pai de Kaio, aparece na seção "acusados de chefiar milícias" e "tendo feito campanha em Rio das Pedras". Em outra página, Domingos Brazão (então deputado) e Chiquinho Brazão (então vereador) aparecem juntos como detentores de influência política em outros bairros dominados por grupos de milicianos - Campinho (comunidade do Fubá e Pedra Rachada) e Oswaldo Cruz. Eles negam envolvimento com a milícia.
No início do mês, Kaio usou as redes sociais para defender a família, da qual pretende herdar o capital político em outubro. O filho do conselheiro afirmou que não há provas para a prisão dos familiares e diz que os Brazão continuam comprometidos com "a verdade e a justiça social".