O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o ex-presidente Donald Trump deram suas últimas cartadas por seus partidos antes das eleições de meio de mandato, que definem a composição do Câmara e de um terço do Senado e podem abrir caminho para o retorno do líder republicano à Casa Branca.
"Este é o momento de defender a democracia. Nossa democracia está em perigo", afirmou Biden durante um comício em uma universidade em Maryland na segunda-feira, 7, em um momento em que o Partido Republicano parece estar levando vantagem sobre os democratas.
A nova composição do Congresso acompanhará Biden durante a segunda metade de seu mandato, até 2024. Eleito em 2021 graças, em grande parte, ao apoio da comunidade afro-americana, o democrata tentou mobilizar novamente essa parcela da população nos últimos dias antes da votação desta terça.
Diante de um público de apoiadores - com exceção de algumas vozes de oposição rapidamente expulsas do local - Biden descreveu os republicanos como o partido que "quer desfazer" os ganhos sociais obtidos sob seu governo.
A campanha expôs as divisões na principal potência mundial. No público que veio ouvir Joe Biden, Marisha Camp, uma fotógrafa que fez uma viagem desde Nova York, resumiu a situação. "Há um senso de urgência na direita, a sensação de que tudo está desmoronando e que é preciso consertar isso... Essa urgência, não sei por que, não é sentida da mesma forma do lado azul", disse ela, preocupada.
Biden disse que pretende concorrer à reeleição em 2024, mas a perspectiva não agrada a todos os democratas por causa de sua idade (ele fará 80 anos em breve) e impopularidade.
As primeiras urnas abriram às 6 horas desta terça-feira, 8, na Costa Leste americana (8 horas em Brasília). Mais de 40 milhões de pessoas votaram antecipadamente em todo o país.
Planos de Trump e dos Republicanos
Donald Trump falou pouco depois de Joe Biden, em um comício organizado em Ohio, emblemático Estado industrial do Centro-Oeste americano em que ele conseguiu seduzir a classe média, majoritariamente branca, que vive no campo ou na periferia, e que acredita ter perdido protagonismo com a globalização.
Trump afirmou que fará "um grande anúncio" na sua residência Mar-a-Lago, na Flórida, no dia 15 de novembro, enquanto flerta com a possibilidade de uma terceira corrida presidencial. "Em 2024, vamos recuperar nossa magnífica Casa Branca", disse o ex-presidente em seu discurso. "Fomos uma grande nação e seremos uma grande nação novamente", continuou, acrescentando: "Este é o ano em que recuperaremos a Câmara dos Deputados e o Senado e, o mais importante, em 2024, recuperaremos nossa magnífica Casa Branca."
Ele ainda dedicou boa parte de seu discurso às pesquisas que o colocam em posição favorável em Estados americanos, tanto em uma primária do partido para eleger um candidato presidencial quanto em uma hipotética reedição da disputa eleitoral de 2020 contra Biden.
O ex-presidente criticou os democratas, descreveu o contexto atual dos Estados Unidos como "o início do comunismo" e pediu, como já fez em ocasiões anteriores, a pena de morte para traficantes de drogas e de pessoas.
Interferência russa e Elon Musk
Embora seja uma eleição para assentos no Congresso e para a liderança de alguns Estados, o cenário eleitoral americano está tão tensionado quanto na disputa eleitoral entre Trump e Biden há dois anos, com o Partido Republicano fazendo um esforço jurídico para invalidar votos por correio, que em tese beneficiam os democratas, e com boa parte de seus candidatos ameaçando não reconhecer o resultado da votação em caso de derrota, o que parece inspirado na narrativa da "Grande Mentira" criada por Trump que, sem provas, afirma que os democratas fraudaram as eleições presidenciais de 2020.
Em meio ao cenário de polarização interna, manifestações alheias à disputa partidária interferem na reta final da eleição. Em um tuíte publicado na segunda-feira, o bilionário Elon Musk, novo proprietário da rede social, pediu aos americanos que votassem nos republicanos. "A divisão do poder freia os piores excessos de ambos os partidos, por isso recomendo votar em um Congresso republicano, já que a presidência é democrata."
A aquisição do Twitter por Musk alimenta preocupações sobre uma onda de desinformação eleitoral, principalmente entre os democratas.
Em paralelo a isso, a Rússia coloca lenha na fogueira. Também na segunda-feira, o empresário Yevgeni Prigozhin, principal financiador do grupo mercenário Wagner e figura próxima ao presidente Vladimir Putin, afirmou que Moscou interfere e vai continuar a interferir nas eleições americanas, na primeira "confissão" do tipo.
"Nós interferimos e continuaremos a fazê-lo. Com precaução, precisão, de forma cirúrgica, de uma maneira que nos é única", declarou Prigozhin, citado em uma publicação nas redes sociais de sua empresa Concord, em resposta a uma pergunta sobre alegações de interferência russa nas eleições de meio de mandato nos Estados Unidos feita pela agência Bloomberg.
Prigozhin é alvo de sanções dos EUA há anos, acusado de interferir em pleitos americanos, incluindo as presidenciais de 2016, vencidas por Trump. Ele é acusado por ter criado uma "fazenda de trolls", ou seja, perfis falsos nas redes sociais para tentar influenciar os eleitores, abalar a reputação de candidatos ou transmitir informações falsas.
A Casa Branca não se disse surpresa com os comentários do empresário russo, de acordo com a porta-voz Karine Jean-Pierre, que também afirmou que as autoridades não identificaram "nenhuma ameaça interna específica crível" à segurança eleitoral.
Controle do Congresso
Os republicanos esperam assumir o controle do Congresso, ou seja, não só da Câmara dos Representantes, como é costumeiro acontecer nas eleições de meio de mandato, nas quais o partido no poder tradicionalmente vira alvo das insatisfações do eleitorado, mas também do Senado, onde os democratas de Biden só têm a maioria por um voto, o da vice-presidente Kamala Harris.
Kevin McCarthy, possível futuro líder dos republicanos na Câmara dos Representantes, cogitou em entrevista à CNN a possibilidade de abrir investigações sobre a administração Joe Biden, desde a retirada caótica de tropas do Afeganistão à gestão da pandemia de covid-19.
Um possível processo de impeachment do presidente democrata não é descartado pelos republicanos.
Também afirmou que não dará um "cheque em branco" à Ucrânia se o Partido Republicano obter a maioria nas eleições. Nesta segunda-feira, a Casa Branca insistiu que o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia é "inabalável", independentemente do resultado eleitoral.
Voto punitivo
Historicamente, as eleições de meio de mandato costumam ser um referendo sobre o inquilino da Casa Branca. Se os democratas forem derrotados, o Congresso estará nas mãos da oposição quando Biden ainda tiver dois anos de governo pela frente.
Diante da eficácia de uma campanha republicana focada na inflação galopante, os democratas tentaram nos últimos dias insistir nas reformas lançadas por Biden, como a redução dos preços dos medicamentos prescritos, o aumento da fabricação de microchips e investimentos recordes em infraestrutura, algo que levará anos para os americanos sentirem os efeitos.
Consciente disso, o presidente tuitou nesta segunda-feira: "Farei o que for preciso para baixar a inflação". Mais de 42 milhões de americanos já votaram antecipadamente, superando o nível das eleições de meio de mandato de 2018, de acordo com o US Elections Project. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)